#Artigo
Patrícia Galvão, a Pagu, artista do modernismo brasileiro e grande militante política, escreveu no seu diário, sobre sua militância de outrora, o seguinte: “O tempo mais feliz da minha vida, em que eu tinha fé… Quando havia um ideal para empunhar uma bandeira. Tempo intensamente vivido; as esperanças, a bondade, o amor, o esforço generoso que nunca buscou recompensa. São coisas pelas quais ainda vale a pena ter vivido”. (Fonte: ZATZ, Lia. Pagu. São Paulo: Instituto Callis, 2005. [A luta de cada um]). Achei interessante e percebi que os ideais de Patrícia Galvão são semelhantes aos meus. É por isso que eu grito para que as coisas mudem! E é esta inquietação que justifica a produção deste texto.
Na nossa sociedade, poucas pessoas são capazes de fazer “um esforço generoso sem pensar em recompensas”. Esforço? Só se ganhar algum (neste momento, pense naquele gesto referente a dinheiro). Muito se fala do caos que está presente na educação pública do país, mas pouco se comenta sobre as suas causas. Culpar os alunos é muito fácil. É uma desculpa que muitos incompetentes usam e que muitos outros incompetentes concordam, porque assim não precisam fazer “esforço” nenhum para melhorar a prática no magistério. Esforço? Oh, desculpe! Tem, sim: é um grande esforço sair de casa para sacar o dinheiro no final do mês.
A escola pública brasileira, com raríssimas exceções, está cheia de gente que não quer trabalhar. Pessoas que, por motivos escusos, alcançam uma certa posição funcional e dela se utiliza para ganhar status na sociedade. Só para isso. Trabalhar, que é bom, nem pensar! O computador com internet serve, apenas, para conferir e-mails com mensagens do Power Point. Pergunta se conhece os recursos do editor de texto? Pergunta se já fez pesquisa no Google com fins educativos? O quê?! Google?! O que é isso? Estou sendo muito cruel, não é? Desde já, peço desculpas. Mesmo porque, fiquei sabendo de uma funcionária pública estadual que, durante duas semanas, “trabalhou” muito: forrou os cadernos dos professores com plástico adesivo. Isso é o que se pode chamar de trabalho pesado! Vale ressaltar que sua função, na escola, não era de secretária. Nem de serviços gerais. Tampouco de estagiária. Enfim, mais uma que não faz o que deveria fazer. Só se “esforça” para ganhar o seu dinheirinho e ainda vive reclamando que o seu vencimento é pouco. Imagine se ela ganhasse pelo que trabalha? Alguém aí já ouviu falar em meritocracia? Cuidado, viu?! Fernando Haddad está querendo instituí-la no Brasil! Ah, para os desavisados, Fernando Haddad é o atual ministro da Educação do país. Em tempo: o fato de os profissionais da educação básica serem mal pagos não pode servir de justificativa para que eles desempenhem um trabalho medíocre. Lembra, professor, que no edital do concurso público que você fez para provimentos de cargos da carreira do magistério público do estado da Bahia tinha, claramente, a remuneração do seu cargo? Ah, tá!
A incompetência e o puxa-saquismo também são males que, infelizmente, estão dentro dos muros da escola. O incompetente tem um discurso democrático e uma prática ditadora. O puxa-saco não tem discurso algum, só ações: claro, aquelas delegadas pelo mentor incompetente. A incompetência e o puxa-saquismo andam juntos. Um precisa do outro para apoiar-se. É um necessidade mútua. É como respirar. Imagina se eles se separam… E não falo apenas teoricamente. Na prática, aonde a incompetência vai o puxa-saquismo vai atrás. Não é difícil reconhecer os elementos que fazem parte dessas “tribos”. O incompetente, como não tem outras qualidades, é aquele que dita regras fingindo praticar a tão propalada “gestão democrática”. Já o puxa-saco é o papagaio-de-pirata do incompetente e concorda com ele em tudo. Sacou?
Quantos absurdos são ditos e ouvidos no cotidiano escolar? Nos meus primeiros meses de aula como profissional, vez por outra, eu escutava: “Este entusiasmo todo dele, para ensinar, é porque tá chegando agora, deixa passar uns cinco anos de sala de aula que eu quero ver. No começo, é sempre assim!”. O tradicional “Seja bem-vindo!”, de fato, ficou no passado. Só quero destacar que, em maio, completei 8 anos no magistério público baiano e carrego os mesmos ideais de antes. Pensar que “escola pública é isso mesmo”, “os alunos não são capazes de fazer este trabalho difícil”, “professor beltrano é insuportável! Ele cobra demais dos alunos e também é muito chato” é tão imbecil quanto afirmar que tatuzinho-de-jardim é inseto.
A propósito, no Brasil, as pessoas que são consideradas “chatas” são aquelas que têm atitudes corretas e cumprem com suas obrigações. Chato é o guarda que pune o motorista infrator; chato é o professor que cumpre o horário e exige dos alunos porque acredita no potencial deles; chato é o juiz que impede que cenas sensuais sejam exibidas na novela; chato é o que contesta as injustiças. Enfim, chato é o correto; o que anda na lei. Na minha opinião, os chatos vão salvar o mundo. Por isso que sou, assumidamente, CHATO!
Uma pesquisa feita em 2008, pela Fundação Getúlio Vargas, coordenada pelo economista Marcelo Neri, apontou que, entre os motivos da evasão escolar, a falta de interesse pela escola está no topo da lista: foi a resposta dada por 40,1% dos alunos. Em segundo lugar, a necessidade de trabalhar (27,1%) e, em terceiro, a dificuldade de acesso à escola (10,9%). Então, isso é óbvio e os dados comprovam: os alunos querem uma escola mais atrativa, com projetos nos quais eles possam ser os protagonistas do processo educativo. Isso se reflete em frases como “Esta escola não tem nada!”, “Por que só a minha escola não faz nada de diferente?”, ditas por eles para quem quiser ouvir. Alguém aí já ouviu falar em protagonismo juvenil? Está lá no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Sabe o que eu acho sobre a postura de alguns funcionários estaduais do magistério público baiano? Eca! Eu não podia perder este trocadilho, não é?
A inércia diante da problemática aqui discutida traduz os péssimos índices alcançados no nosso sistema educacional. Por que, em vez de ficar conversando sobre os móveis que comprou para a casa nova em pleno expediente, não se pensa em produzir algo que seja relevante para a comunidade escolar? A escola é lugar de trabalho, não de conversar futilidades. Você está sendo pago (a) para trabalhar. Saiba disso! O governo até tem investido em educação; o grande erro dele é não fiscalizar como deveria.
Muitos professores de escolas públicas, que têm filhos, não matriculam os seus pupilos nas escolas para quais trabalham, exceto quando querem castigá-los pelo mau desempenho na escola particular. Ou seja, quando o filho perde de ano numa instituição privada, o “castigo” é colocá-lo numa instituição pública. Esta é uma prática comum, não só entre professores, mas em toda a sociedade. Alguém pode dizer: “Ah, é porque eles querem o melhor para os filhos, por isso os colocam na escola particular!”. Mas, a escola pública não é melhor por quê? Eu, hein!
Percebo também que grande parte dos pais de alunos não se preocupa em cobrar mais da escola. Estão muito acomodados! E aqui, mando um recado: senhores pais, fiscalizem e participem mais da escola em que seu filho estuda! Procurem saber os métodos e as estratégias utilizadas para promover o aprendizado, a formação dos professores e a qualidade dos materiais didáticos. Enfim, façam com que a escola cumpra, de fato, a sua função social: formar cidadãos.
Comecei este texto citando uma grande mulher e vou terminá-lo com outra ilustre brasileira que luta por um país melhor e mais justo: Viviane Senna. Em uma entrevista para a revista ISTOÉ, em 25 de outubro de 2006, ela afirmou: “ O sistema educacional brasileiro é um exterminador do futuro”. Concordo, plenamente, com ela. Sabe por quê? Porque a ênfase da nossa educação está na quantidade e não na qualidade. O que deveria ser um formador de cidadãos conscientes e competentes está se tornando um produtor de ignorantes. Sei que a culpa não é só dos alunos. Tenho a minha parcela de culpa, mas, acima de tudo, sempre procuro melhorar. Sei também de profissionais excelentes que, como eu, lutam por uma educação pública, verdadeiramente, de qualidade. A eles, minha vênia. A culpa é, principalmente, daqueles que não querem trabalhar. Enfim, há talento para tudo. Inclusive, para a incompetência e para o puxa-saquismo.