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O poeta de todos os lugares | Escritor baiano usa nomes de cidades, lugarejos e elementos do relevo para fazer poesia

| Perfil

Bastam dois dedos de prosa com José Luzenário de Souza para que a simpatia entre interlocutores se estabeleça. O escritor baiano de 46 anos, natural do município de Canavieiras, é daquelas pessoas que conseguem chamar a atenção sem fazer muito esforço para tal. Isso se dá, principalmente, por causa da literatura que produz e do entusiasmo que tem ao falar do próprio trabalho. Os olhos do canavieirense, radicado no bairro do Cabula, em Salvador, brilham quando ele descreve a novidade literária que criou. E não é para menos: José Luzenário é um poeta que brinca com nomes de cidades, povoados, lugarejos e elementos do relevo para se expressar poeticamente. O leitor está curioso para saber como isso acontece? Então, veja o poema abaixo:



Política de gente BIZARRA(PE)

A BOA FAMÍLIA (MG)

dos ALBERTOS (MG)

e suas crianças AMARELAS(CE)

Continua sem ALMOÇO(PA)

Sem ASSISTÊNCIA (SP)

Sem CONSULTA (SP)

Aos FARRAPOS (RS)

Feito os MAMONAS (MG)

“PELADOS (PE) em SANTOS(SP)”

E o político ARRUDIADOR (CE)

diz que é GENEROSO (PR)

Só se for com a ZORRA (CE)

 

Entendeu como se dá o processo criativo do artista? José garante que os nomes que aparecem em maiúscula nos seus textos se referem a algum topônimo nacional. O Desde fez uma rápida pesquisa na internet e encontrou grande parte dos nomes do poema acima como sendo de lugares do Brasil. Para quem quiser conferir a veracidade, fica o desafio. O que é indubitável e indiscutível é a criatividade presente na literatura produzida pelo escritor. Até o próprio nome artístico dele, José Luzenário de SOUSA (PB), faz menção à brincadeira.

 

A ideia_ De acordo com José Luzenário, a ideia de colocar nomes de lugares nos textos poéticos surgiu de uma provocação: “Uma vez, na praça da Piedade, ouvi uma senhora conversando sobre a  Itália e ela dissecava o país com precisão cirúrgica, tal qual um açougueiro. Eu imaginei : será que essa senhora conhece o Morro do Pai Inácio? Itacaré? A Ponta de Nossa Senhora? A partir daí, senti necessidade de arranjar uma forma de mostrar a cara do Brasil em meus trabalhos. Olhando o mapa do nosso país, comecei a brincar com os nomes exóticos das cidades e as minhas descobertas fizeram com que o negócio ficasse sério. Hoje, visto meus poemas de cidades e as cidades de poesia”, filosofa.

Para chegar à obra-prima, o escritor faz uma verdadeira odisseia cartográfica. Além de fazer bastante pesquisa na internet para garimpar os nomes dos lugares, o quarto dele é repleto de mapas. Na adolescência, alguns hábitos de leitura já evidenciavam essa inclinação do escritor para, digamos assim, o estudo da superfície terrestre: “Aos 15 anos, quando comecei a escrever, lia muita história em quadrinhos e adorava livros de geografia. Por isso, amo o mapa do Brasil. Às vezes, passo horas ‘namorando’ os lugares”, revela. Mas a principal referência que usa para encontrar os nomes dos lugares é o Guia Cartoplam de Rodovias do Brasil, que tem pouco mais de 9000 localidades. 

 

Para produzir os textos, José busca inspiração em coisas simples, como o cotidiano do povo brasileiro, a natureza, as notícias de jornais e de TV, os casos que lhe deixam indignado e até histórias vividas por pessoas que ele conhece. Disso tudo, nasce uma poesia que faz um retrato do Brasil e dos brasileiros, já que toda e qualquer temática “cabe no poema”.

Origem_ Nascido numa família grande (ele tem 29 irmãos por parte de pai e seis por parte de pai e mãe), José Luzenário foi, entre os seis irmãos, o único que conseguiu ingressar no ensino superior. Em 1985, foi aprovado no curso de Administração de Empresas da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), situada em Ilhéus. Entretanto, devido a dificuldades financeiras, não pôde concluir a graduação.  Foi para Recife, passou na 1ª fase (e perdeu na 2ª) do curso de Engenharia Florestal, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).  Em 1988, chegava a Salvador.

A leitura sempre foi uma atividade prazerosa e constante na vida do escritor. Dentre os mestres da literatura que admira, está o poeta modernista Manuel Bandeira, que considera um baluarte. Contudo, quando o assunto é livro predileto, ele cita um escritor pouco conhecido do público: Neimar de Barros, com sua obra Deus Negro.

Apesar de ter verdadeira paixão pelas letras, José Luzenário tem consciência de que literatura no Brasil ainda não é reconhecida como deveria. Por isso, para aumentar a própria renda, trabalha de forma autônoma, vendendo roupas femininas.

Projetos_ Convidado para participar da 22ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo, que acontece de 9 a 19 de agosto deste ano, José Luzenário diz que a expectativa é grande e que quer “escancarar a cara do Brasil pra Deus e pra o NOVO MUNDO (MT)”. Na ocasião, pretende lançar os livros Poesia Popular Brasileira 1- De SOUSA(PB) a SANTANA (AP) de PARANACITY (PR) a NOVA IORQUE (MA) e Poesia Popular Brasileira 2- De CABRAL (SE) a FAZENDA DILMA (PA) do IRAQUE (SE) a CAFARNAUM (BA). Obras que, por sinal, estão à venda no site www.clubedeautores.com.br e foram contempladas com o selo de reconhecimento pela a equipe do Clube de Autores. Na página eletrônica, é possível também ler as primeiras páginas dos livros do poeta. Para ter acesso, o internauta deve colocar o nome do autor ou da obra na seção de “busca”.

Em 2012, José tem a intenção de publicar mais quatro livros, sendo que um deles é totalmente diferente do que já fez. Ou seja, nada de nomes de lugares nos versos. O maior sonho do autor é ver todas as crianças nas escolas. “Quero ver mais sorriso que tristeza no rosto das inocentes crianças. Adulto sabe se defender; criança, não. Além disso, sonho com um planeta ecologicamente mais equilibrado e humano”. Para o leitor, ele deixa uma última mensagem: “SAÚDE (BA) e LUZ (MG) PARATY (RJ)”.

# Antologia:

Racismo separa mais que ARAME (MA) farpado

Se existe BREU BRANCO (PA)

é porque as cores se misturam

independentes de BRANCOS (SE)

negros ou ÍNDIO (GO)

Com isso eliminamos o CORDÃO(SE)

o CERCADINHO (BA)

que separa o RIO PRETO DA EVA (AM)

o CALDEIRÃO DOS MULATOS (BA)

a morenaça de BRANQUINHA (AL)

e o CALDEIRÃO DO NEGO (BA)

BELO MONTE (AL)

Nem no MONTE NEGRO (RO)

Nem no MONTE BELO (MG)

e nem em BELMONTE (BA)

Com a triste USINA (PA)

Como vai ficar o BELO MONTE(AL)

Nem se fosse um RIACHINHO (TO)

Queira Deus

Que eles tirem BARRAGEM DO CAMINHO (BA)

RIO DO BRAÇO (BA)

A BOCA DA MATA (AL)

ENGOLE (MA)

o BRAÇO DO RIO (ES)

Carrega GALINHA MORTA (BA)

lá para o MORRO DO AZEITE (MS)

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O Ano Novo começou e nada melhor do que pensar em boas novidades para os próximos dias, não é? Em 2012, o blogue Desde que eu me entendo por gente vai destinar as suas páginas para muito mais reportagens e entrevistas. Desde já, agradeço a todos os leitores que deram uma passadinha por aqui no ano passado. Continuem prestigiando o blogue em 2012. Em tempo: O Desde está de cara nova. O que você achou?
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