Tomo sopa de letra pra não comer H*
Por Raulino Júnior ||Texto de Quinta||
“De repente, não mais que de repente”, parte da sociedade civil brasileira descobriu que o #racismo existe e que assassina pessoas. Contudo, essa descoberta só aconteceu depois do assassinato de George Floyd, nos Estados Unidos. Por isso, as hashtags em inglês: #BlackLivesMatter e #BlackoutTuesday. Em 2 de junho, elas tomaram conta das redes sociais digitais. Parodiando os Titãs, “uma hashtag em inglês é bem melhor do que eu e vocês”**. Só depois desse auê todo, e de #Mitar, é que #VidasNegrasImportam (em português do Brasil!). Essa comoção seletiva só evidencia que morar no Brasil não significa ter sentimento de Brasil. Talvez, tenhamos que voltar a ser #EstadosUnidosDoBrasil. #VaiQueFunciona!
O ativismo intermediado pelas tecnologias digitais, conhecido como #Ciberativismo e conceituado por Vegh, de forma geral, como aquele que é realizado por grupos politicamente motivados com o auxílio dos recursos da internet, é uma das possibilidades mais interessantes de ampliar vozes e de mobilizar pessoas, e deve sempre ser considerado. Porém, o ativismo não nasce no ciberespaço. Ele é um processo anterior, de luta e de tomada de consciência dos problemas sociais. O #AtivistaRaiz usa as plataformas da web como extensão da sua causa. O contrário disso é só uma busca desenfreada para a #TrocaDeLikesSemFim, que é o que tanto se busca hoje em dia. #FalaSério! Isso não significa que você não possa entrar nas #LutasPontoCom. Pode. Mas é importante entrar com consciência, pela #Causa e não pelo #Efeito. Tipo: #PostarSóPorqueTodoMundoPostou. Isso é vazio. Não muda a realidade nem muda você. #FicarMudoÀsVezesÉMelhor. O silêncio ensina e pode ser a razão para a busca do aprendizado. Olha! #Filosofei!
#QualÉASua?
As hashtags são usadas para vincular assuntos da mesma natureza. É um medida inteligente nessa seara das redes sociais da internet, que vive abarrotada de conteúdos para tudo quanto é lado. Elas funcionam como um filtro e, quando bem usadas, são poderosas. Campanhas como #MexeuComUmaMexeuComTodas e #GordofobiaNãoÉPiada, só para citar algumas, conseguiram provocar mudanças na forma como a sociedade sempre lidou com práticas sociais condenáveis. Entretanto, antes disso, já existia uma consciência política e social de quem lutou por tal reparação. Ou seja: #NãoDáParaUsarSóPorUsar. Lembra da ideia de #ArtePelaArte do #Paranasianismo? Não queira defender a #HashtagPelaHashtag! Será que quem foi às ruas empunhando cartazes de #EleNão, no fundo, queria era #EleSim? Só estava na mobilização para ser um #MarioVaiComOsOutros? #ÓVocêErrado!
Já parou para pensar e se perguntou: qual é a minha no mundo? Qual legado que eu quero deixar? Do que eu quero ter orgulho? Sim, você vive na era da revolução tecnológica e pode usar tudo isso a seu favor. Certamente, você não quer ser um amontoado de hashtags, não é? Eu tenho certeza que não. Acredito no ser humano e no mito do bom selvagem, de Rousseau. Tudo bem que, vez por outra, a gente pega uma hashtag para chamar de nossa. Nesse caso, o uso dela tem um vínculo com a gente, não está distanciado da nossa vida nem tem o propósito de seguir a manada. A coisa não fica bem quando a gente usa para, muitas vezes, ter uma #PopularidadePelaPopularidade. Qual é a sua? As minhas, da vez, são #RomânticoCondoreiro e #MalandragemNãoTemEtnia.
#EdiçãoHistórica?!
Depois da descoberta do racismo em território nacional e depois de ser criticada nas redes sociais digitais por promover um debate sobre o assunto apenas com jornalistas brancos, a Globo News fez uma edição considerada histórica (?!) do telejornal Em Pauta. O auê se deu porque a emissora reuniu apenas os poucos jornalistas negros fichados no seu #RH para relatarem as suas experiências com o racismo. A atitude da #VênusPlatinada fez muita gente comemorar, inclusive parte da comunidade negra que se autodeclara #Militante. #QualÉOMotivoDaComemoração? Porque se a gente ligar a TV agora nas emissoras afiliadas à Rede Globo, a gente vai perceber que aquilo foi uma ação pontual, de um dia. A página virou e o espírito de #VidasNegrasImportam da empresa vai ficar para…depois.
Toda e qualquer #AtitudeAntirracista é válida, mas tal atitude tem que estar presente todo dia. O racismo daqui é diário, é secular, sempre existiu. O negro no Brasil é tão desorientado que comemora qualquer migalha como sendo banquete, esquecendo-se que a festa continua acontecendo nos salões e ele só é convidado para servir. O que seria histórico mesmo era as emissoras garantirem a proporcionalidade entre os seus colaboradores. Era ver negros em todos os canais, mostrando a sua competência. Era o mercado de trabalho não subalternizar corpos negros. Isso não é favor, é direito. Aí, sim, teríamos motivos para comemorar. Um parêntese: TV é concessão pública! Enquanto a gente aplaudir o opressor porque ele fez o que tinha que ser feito sempre, as mudanças não vão acontecer. Ele vai continuar cheio de si, achando que já cumpriu o seu papel, e a gente cheio de nós. #NósPorNós?! #Kkkkkkkkkkk! #FiqueNessa! Tal qual George, a gente não consegue respirar um dia com tranquilidade neste país.
____
*Kiko, Serginho, Zeca e Sandro em Sopa de Letra.