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Ele é tudo. Ele faz tudo. Rosberg Adonay é um mundo!

Multiartista radicado em Caruaru “pula, canta, dança e faz acontecer”*

Rosberg Adonay: artista pernambucano inquieto e multifacetado. Foto: Jorge Farias

Por Raulino Júnior

“Eu mesmo assumo as funções, pois não tenho orçamento para contratar os profissionais”. É assim que Rosberg Adonay Rodrigues Galvão, 25 anos, há 11 no ativismo artístico, responde à pergunta sobre o que falta ser. Porque, quem acompanha as suas redes sociais digitais, vê que ele é ator, poeta, dramaturgo, diretor, cantor, compositor, produtor cultural, bailarino, figurinista, iluminador… A justificativa: “Eu sempre tive curiosidade em aprender todas as linguagens que têm relação com a arte. Eu me identifico completamente e tenho muita facilidade de aprender. Tenho que aprender de tudo um pouco, para poder realizar o trabalho”.
E o trabalho que Rosberg realiza não é pouco. Além de ser arte-educador na Secretaria de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos da Prefeitura de Caruaru, ele atua, cria, compõe e produz na Trupe Veja Bem Meu Bem, grupo de teatro que tem como objetivo aproximar o artista do público. “Isso é implementado atingindo as minorias, comunidades, escolas, universidades, grupos parceiros. Atingindo o público de várias formas, adequando espaços e linguagens. Levar a arte até onde existe a ausência da arte”, explica. É também integrante da Trupe Gargalhada (onde é o palhaço Biliro) e da Cia Pernas Pra Circulá. Protagoniza o monólogo Poeta Preto, cujo objetivo é chamar a atenção para o preconceito que os negros sofrem na sociedade, e, nesse momento de distanciamento social devido à pandemia do novo coronavírus, utiliza as redes sociais digitais para compartilhar experimentos cênicos. “Eles partem de um processo de pesquisa sobre a criação individual, independente e orgânica. As plataformas digitais têm suas importâncias, agregam no crescimento artístico do trabalho e é a única opção no distanciamento social para continuar trabalhando e produzindo”. Contudo, apesar de toda essa versatilidade, ao ser indagado como se define artisticamente, Adonay não titubeia: “Ator criador e produtor cultural. Consigo agregar outras definições à palavra criador. O ator que cria sua obra com poucos recursos financeiros, mas com muito profissionalismo e amor”.
Família, Caruaru, formação artística

Rosberg Adonay no seu quarto: espaço de criação artística. Foto: Jorge Farias

Embora tenha nascido em Belo Jardim, Rosberg considera São Bento do Una sua cidade natal e Caruaru a de coração. “Me considero 50% caruaruense. Amo de coração essa cidade, sua história, sua riqueza. Acredito que meus ancestrais eram os cariris, que habitavam antes dos primeiros fazendeiros invadirem suas terras, em Caruaru e nas cidades vizinhas, como PesqueiraArcoverde, Belo Jardim, São Bento do Una… Tenho certeza que minhas raízes estão nesta região”. Ele chegou a Caruru quando criança. Os genitores, Márcia Rodrigues de Moura e Sérgio Rogério Galvão, se separaram e a mãe decidiu fixar residência na cidade, também conhecida como a “Capital do Forró”. Rosberg e as irmãs, Marian e Indiara, foram criados por Márcia e pela avó materna, dona Darcy.
“Foi onde conheci o teatro e a arte”, complementa, ao falar de Caruaru. Conheceu e se formou. Na verdade, a formação de multiartista começou na infância. “Eu tinha um comportamento superartístico, através do rádio, da TV, da Igreja Católica e da escola. Eu ia sempre à missa com minha mãe e minha vó, e decorei as músicas, o texto do padre, as marcações. Chegou um tempo que eu sabia a missa inteira. Decorava comercias de TV e gostava de cantar todos os dias, à tarde, no quintal de casa, as músicas das novelas e as que ouvia pelo rádio. Sempre quis dançar nos eventos da escola, apresentar trabalho na frente da sala; mas eu sempre fui um pouco tímido, reservado. Hoje, ainda sou um pouco, mas não mais no profissional. Hoje, eu me defino como ator criador pelo ato de compor uma obra independente, desde a função de diretor, autor e produtor até as de contrarregra, figurinista, iluminador, cantor, compositor e o que for preciso para fazer o que amo e dar vida à minha obra”. 
 
E para essa obra ganhar vida, Rosberg foi atrás do aprendizado. Passou pelo tradicional Teatro Experimental de Arte (TEA), o Cena Aberta e o Grupo Andanças (de dança contemporânea). Foi fisgado pelo teatro, arte que o possibilita experimentar de tudo, uma arte-mundo. “Eu me encontrei no teatro. Encontrei pessoas com semelhanças parecidas com as minhas, personalidade, forma de pensar. No teatro, eu encontrei respeito, coletividade, companheirismo, disciplina, trabalho, amor…”.

Rosberg e seu mundo artístico

Rosberg em cena do espetáculo Poeta Preto: morte por branqueamento ideológico. Foto: Jorge Farias

Em 2009, quando começou a fazer teatro, Rosberg era Rosberg Alexsander. “Era uma desconstrução social e também pelo fato de escolher um nome artístico para se compor enquanto obra/artista”. Depois, passou a ser Dom Alexsander Preto. “Eu vejo como um processo de descoberta”. Hoje, assina Rosberg Adonay. “Me apeguei ao meu próprio nome, acho que fala mais. O Adonay é muito forte e o Rosberg é marcante”. Marcante também foi o ano de 2014, mais precisamente o 1º de março, quando começaram as vivências artísticas da Trupe Veja Bem Meu Bem [assista ao vídeo em que Rosberg fala sobre o início da Trupe], da qual é um dos fundadores. Já no primeiro ano do coletivo artístico, independente e alternativo de teatro, como Adonay descreve a Trupe, encenou e atuou no espetáculo Cadê o meu amor que não veio? e, com ele, foi premiado Melhor Ator do XVI Festival  de Esquetes de Caruaru (Festec). Contudo, ele não fica envaidecido com premiações e considera o processo artístico mais importante que a obra. “O prêmio é apenas um reconhecimento artístico de uma determinada apresentação. O teatro é como a vida, se renova a cada dia. No meu ponto de vista, o processo é mais importante que a obra, no aspecto de valor artístico e aprendizagem. A descoberta da criação, das possibilidades, da troca com o outro. A obra tem o seu valor, as apresentações que ficam marcadas, a troca com o público. O reconhecimento é mais um passo. O sentido é manter a obra em pé, viva e forte. Tem que fazer sentido dentro, tem que ter amor e humildade”.

Fazer sentido é uma premissa que acompanha o artista desde sempre. Por isso, faz questão de dizer que faz militância na arte. O monólogo Poeta Preto, que estreou em outubro de 2017,  é um grito que reverbera toda essa luta por justiça social. Com texto de Vanderson Santos e direção de Pedro Henrique, o espetáculo aborda racismo e desigualdade, problemas ainda tão comuns na sociedade brasileira. “Sempre levo comigo a questão da militância na arte. Discussão sobre desigualdade, violência, racismo, feminicídio, LGBTfobia, genocídio, intolerância religiosa. O Poeta surge como porta voz da classe oprimida. Não tem arrodeio, é a verdade e a realidade nua e crua na cara da plateia. Ele é a própria consciência humana e desafia a plateia o tempo inteiro a ouvir, pensar e refletir sobre a nossa existência e o que estamos fazendo aqui enquanto seres humanos. O Poeta morre no final do espetáculo, pintando seu rosto de branco e vomita na cara de todos. Ele morre de branqueamento ideológico, frustração, porque ainda existe racismo, ódio, negação nos olhos de algumas pessoas que assistem. Ele morre porque eu, o ator que o interpreta, ainda saio na rua e sou discriminado por ter um black power enorme. Piadas. O olho fala mais em alguns momentos. Ele morre porque a plateia fica em choque emocional, porque alguns não entenderam, não refletiram, nem se quer ouviram. Ele não morre, ele sempre renasce, ele é nós, ele é também nossa voz”, desabafa.Em 2016, fez uma participação no show A mulher do fim do mundo, de Elza Soares. Descreve a experiência como “maravilhosa e encantadora”. “Agradeço demais a Gabriel Sá e a Chico Marinho, grandes artistas da terra, que me indicaram para fazer a participação no show de Elza, no Festival de Inverno de Garanhuns (FIG). Eu e mais três amigos da arte e militância. A performance era entrar, sentar perto de Elza e criar relação com ela, os músicos, a musicalidade e o público. Acho que a minha entrega nessa cena foi incomparável a qualquer outra que já fiz. Eu estava ao lado da Rainha, da Mulher do Fim do Mundo, aquela que sempre escutei desde pequeno no rádio e na internet”.

Rosberg Adonay durante a videoperformance Por Perto, poema de Pierre Tenório: artista multimídia. Foto: Jorge Farias

Rosberg é multimídia. Participou de curtas (João Heleno dos Brito, de Neco Tabosa; e Ela é artista, de Vander Santos), da série AFROntar (TV Jornal Interior) e do longa Palavras de Rua (Pablo), dirigido por Léo Batista e Paula Monteiro. Está preparando o curso on-line O lugar onde se vê, no qual vai abordar o processo de criação artística e improviso. No final, pretende montar uma adaptação do texto A parte que falta, do estadunidense Shel Silverstein. O projeto é uma parceria da Right Hemisphere Creative Productions (mais uma ação de Rosberg) com a Trupe Veja Bem Meu Bem.

O belo-jardinense carrega traços de seriedade e meninice, na mesma intensidade. Isso, obviamente, se reflete em suas produções. Na Trupe Gargalhada, onde assume a persona do palhaço Biliro, mostra a criança viva que habita o seu corpo. “Com o Biliro, eu volto a ser criança. É meu exagero irônico, meu eu poético. Ainda estou descobrindo esse clown, em processo de criação. O Biliro é mais um filho que crio, mais um grande artista, como o Poeta, a Nega Rhos, Patativa do Assaré, Chicó, Gregório Sampsa, Biriba e mais alguns que não lembro”, enumera os personagens que viveu/vive. Nas composições musicais e poéticas, fala do homem que é, de liberdade. Usa todas as formas de  expressão artística para se sentir nu, livre. “Nada é forçado. Tudo é desejo e arte. Meus poemas são meus pensamentos encharcados de palavras, são explosões de sentimentos presos. Escrever é limpar, é reiniciar seu corpo, sua mente, seu estado de espírito, é conversar com você mesmo, relatando no papel. Um mar de palavras da mente, escritas no papel, organizadas em forma de reflexão e história. Eu lembrei que quando era criança, fiz uma promessa: prometi a mim mesmo que iria aprender a ler e escrever, pois adorava a escola. Escrevo desde que aprendi, na escola pública, lendo livros na biblioteca”. E assim Rosberg segue escrevendo a própria história, caminhando num mundo que não tem limite, porque é dele. 
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*: referência à música Eclético, de Edu Tedeschi.

 Que gente é você?

Por que você brilha? 

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Canais de Rosberg Adonay nas redes sociais digitais:
 
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Série Gente é Pra Brilhar! | Ficha Técnica:
Convidado: Rosberg Adonay
Data da entrevista (feita por e-mail): 19/8/2020
Idealização/produção/texto: Raulino Júnior
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“Gente é pra brilhar!”: série de perfis abre pré-comemoração pelos dez anos do Desde

Série integra projeto #Esquenta10AnosDoDesde

Por Raulino Júnior

O aniversário de dez anos do Desde é só em janeiro de 2021, no dia 1º, mas a nossa sede de produzir conteúdos jornalísticos é tão grande que vamos fazer uma pré-comemoração para antecipar o grande feito de estarmos há uma década, ininterruptamente, no ar. Tudo foi pensado no primeiro semestre deste ano e faz parte do projeto #Esquenta10AnosDoDesde. Depois de muitas leituras, pesquisas e imersão no universo do jornalismo cultural, chegou a hora de implementar.
A primeira das ações da nossa pré-comemoração é a série de perfis intitulada Gente é pra brilhar!. Pegamos emprestado um dos versos mais famosos de Caetano Veloso para contar histórias de pessoas que brilham pelo Brasil afora. Queremos investigar se “cada estrela se espanta à própria explosão”.

Card publicado nas redes sociais digitais, em 15 de julho, dando pistas da série pré-comemorativa

Em 2014, para comemorar os nossos três anos, fizemos a série Perfis do Desde. Naquela ocasião, contamos histórias de pessoas próximas, que conhecíamos ou que tínhamos algum contato. Dessa vez, o desafio vai ser ainda maior: vamos contar histórias de pessoas que conhecemos pela internet, nas interações através das redes sociais digitais. Como criar o perfil de alguém que você não conhece tanto nem tem ideia de como a pessoa é? Esse vai ser o grande e saboroso desafio. Jornalismo é percepção, é observação, é atenção. A nossa jornada vai começar no próximo domingo, 30 de agosto. O convite está feito e a “gente quer luzir”!
 
Desde que eu me entendo por GENTE
Bicho (album) - Wikipedia

Capa do disco Bicho, lançado em 1977.

A canção Gente, da qual tiramos o verso que dá nome à nossa série pré-comemorativa, é a terceira faixa do disco Bicho, que foi lançado pelo “bruxo de Santo Amaro” em 1977. O álbum tem outras músicas marcantes da carreira de Caê, como OdaraUm ÍndioTigresa e O Leãozinho. Na página 41 do livro Sobre as Letras (Companhia das Letras, 2003), organizado por Eucanaã Ferraz, Caetano fala sobre Gente:
É uma letra ingênua. Quando eu estava fazendo, achava uma loucura aquela música, que parecia coisa da Broadway, de musical de segunda. No show Transversal do tempo, Elis Regina cantava “Gente” como se estivesse debochando da canção, com o arranjo servindo ao deboche, e aparecia “Beba Gente” escrito atrás, como se fosse Coca-Cola. E ela fazia tudo como se fosse um show de travesti, como se fosse uma bicha. Depois, inclusive, ela pegou aquele hábito de fazer show feito bicha. Em Trem azul, o último show dela, ela apresentava os músicos assim: “Os meus bofes, esse aqui…”. Parecia um espetáculo da Rogéria, era muito bom. A Elis ficou muito melhor no final. Foi melhorando, melhorando, melhorando. Ela era boa musicalmente.
Um pouco antes de morrer, ela me escreveu uma carta dizendo que aquilo que ela tinha feito com a minha música em Transversal do tempo tinha sido ideia dos diretores do show, que ela não queria, que, por ela, não faria aquilo, e me pediu desculpas.
“Gente: espelho da vida, doce mistério”, não é mesmo? A seguir, ouça Gente.

No vídeo abaixo, veja a declamação do poema Gente.

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“Não vote em branco. Vote em Colé!”

Raulino Santos Cerqueira e Raulino Santos Cerqueira Júnior: 💝💝

Por Raulino Júnior ||Desde Já: as crônicas do Desde||

Esta crônica estava na minha cabeça há muito tempo, desde que eu soube do slogan do meu pai para a campanha em que ele almejava uma vaga na Câmara Municipal de Conceição do Jacuípe, nas eleições de 1988. Só faltava um mote para poder derramá-la. Hoje, Dia dos Pais, achei que fosse uma boa ocasião.
Meu pai é uma figura. De fato! Divertido, boa praça, simpático. É muito conhecido em Berimbau (apelido de Conceição do Jacuípe), cidade onde mora e que ama (amamos, no caso). Por muito tempo, chegar aos lugares e falar que era “filho de Colé”, lá em Berimbau, se tornou uma referência para mim. Já tinha, como a gente fala, meio caminho andado. É que painho é um cara influente, de boas relações, de coleguismo, de amizades. Empreendedor nato! Foi um dos pioneiros a produzir eventos com bandas na cidade. Também foi responsável por um dos trailers de lanches mais badalados de lá, o KarlaK, nome que homenageia a minha irmã mais experiente, Karla Kristyane. E teve outros empreendimentos! Loja de colchão (RKR Colchões), barraca no Arraiá do Berimbau… Enfim, com todo esse espírito de vanguarda, só não me conformo de ele não ter formado a dupla “Karla e Júnior”, para eu e minha irmã podermos, hoje, estar contando (e cantando) a #NossaHistória em shows lotados pelo país. Bem, isso é pauta para outra crônica…

Só faltou isso…

Meu pai é uma referência para mim e para todos da família. Sempre assumiu quem era e representava isso nas atitudes, nas músicas que ouvia e, às vezes, no vestuário. De forma leve, educada e sem radicalismos. Ficou de lição. Sempre acompanhou as tendências! Lembro que, numa época, adotou um visual semelhante ao de Tatau, então vocalista do Ara Ketu. Eu, que já gostava dessa vertente da música baiana, pensava: “Tenho um Tatau em casa!”. Era o máximo!

Despojado, festeiro, o adolescente da turma. Até hoje! E popular! Muito popular! Tanto é que essa popularidade toda o fez acreditar que venceria as eleições municipais de 1988, em que se candidatou a vereador. “Para nossa alegria”, teve míseros 32 votos. Ufa! Ainda bem! Ele pode contribuir para o Poder Legislativo de outra forma, não é? Vencedor e progressista mesmo foi o slogan criado para a campanha, idealizado pelo amigo Marcos Grilo: “Não vote em branco. Vote em Colé!”. Meu pai é uma figura! Meu pai é genial!
Sigamos.
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