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Qualidade de música feita para o Carnaval vira foco de debate em feira sobre a festa

Compositores baianos opinaram sobre músicas feitas para o período carnavalesco

Rafa Chagas, Manno Góes, Marcio Mello e Magary Lord em painel que debateu sobre música do Carnaval. Foto: Raulino Júnior

Por Raulino Júnior

A Expo Carnaval Brazil, feira de negócios sobre a festa que é considerada a maior do país, promoveu, na tarde de hoje, um debate sobre música do Carnaval e sobre a importância dos compositores dentro de toda a estrutura carnavalesca. Rafa Chagas, Manno Góes, Marcio Mello e Magary Lord refletiram e opinaram sobre o tema. Entre discussão sobre processo criativo para compor e o que faz uma música ser bem-sucedida, os compositores debateram sobre a qualidade da música feita para a folia. Assunto sempre controverso, pois há muita crítica em relação aos critérios utilizados para dizer que uma música é de qualidade ou não, foi Magary Lord quem levantou a bola: “Essa necessidade de ser a Música do Carnaval acabou plastificando a nossa música, que perdeu a força de poesia”. Manno concordou com Magary, mas pontuou que isso é reflexo da sociedade. “Hoje, a linguagem é mais direta. A música perdeu as metáforas. O cara fala logo que quer meter… Nem sempre a Música do Carnaval é a música inesquecível. Tem músicas que ganharam como Música do Carnaval que ficou lá esquecida naquele Carnaval e nunca mais ninguém nem falou, nem quis ouvir, nem quis citar”. Para Marcio Mello, as pessoas não devem levar tão a sério a música feita para o Carnaval. Ele ainda destacou a importância da espontaneidade artística nesse processo. “Antigamente, os intérpretes ouviam as músicas dos compositores e decidiam gravar porque gostavam das canções. Eu não mandei Nobre Vagabundo para Daniela [Mercury]. Ela foi a um show meu, ouviu e gostou. É preciso pegar a espontaneidade do compositor e tornar algo perene”.

Música do Carnaval: apenas negócio?

Em entrevista exclusiva para o Desde, Rafa Chagas, Magary Lord e Marcio Mello opinaram sobre o fato de alguns artistas buscarem o tempo todo o título da Música do Carnaval, sem se preocupar com o fazer artístico. Para Rafa, isso gera um desafio, que pode ter seus prós e seus contras. “Acaba gerando um desafio entre o artista. Se for de uma forma positiva, a gente sai ganhando, porque contribui para o movimento. Principalmente, se for música da quebrada, o fortalecimento é muito maior. Se for do lado negativo, a gente sai perdendo, mas a música tem esse poder de unir. A música é universal, agrega todos os ritmos, todos os povos. A música é o encontro de tribos”. Indagado se a música deve ser só pensada como negócio ou como produto artístico que é, ele é enfático: “Os dois! A gente precisa colocar comida dentro de casa. A gente precisa pagar a nossa conta, a conta do filho, a escola, o cartão de crédito que está ali devendo… Acho que se a gente juntar esses dois lados, a economia e a questão da arte, a gente consegue caminhar e ter uma resposta positiva para o nosso trabalho”.

Rafa Chagas: “Se a gente juntar esses dois lados, a economia e a questão da arte, a gente consegue caminhar e ter uma resposta positiva pro nosso trabalho”. Foto: Raulino Júnior

Magary acha que o problema está na falsa percepção de que todo mundo pode compor. “A composição e a poesia são coisas para pessoas especiais. A poesia é coisa muito séria. Então, essa coisa virou uma dinâmica de muito imediatismo da música, da rima de mamão com melão. Isso acaba nos prejudicando como compositores que lemos um bom livro, que lemos dicionários, que temos uma oratória e que nos importamos realmente com a mensagem. A mensagem é mais importante do que a música em si. A batida do pagode é uma batida maravilhosa, que a gente adora, mas quando coloca algumas letras em cima, a coisa fica plastificada e não presta mais”.

Magary Lord: “A mensagem é mais importante do que a música em si. A batida do pagode é uma batida maravilhosa, que a gente adora, mas quando coloca algumas letras em cima, a coisa fica plastificada e não presta mais”. Foto: Raulino Júnior

Ao responder sobre as composições voltadas para o Carnaval feitas na atualidade, Marcio Mello diz que elas abraçam mais ritmos. “A música vive um momento muito bom hoje, porque ela é aberta a milhões de possibilidades. No meu tempo que eu pulava Carnaval, na adolescência, era mais voltado para marchinhas e tinha quatro, cinco compositores. Hoje, a diversidade é muito grande. Consequentemente, a música também se torna muito maior, muito mais abrangente. A música do Carnaval hoje abraça todos os ritmos. Então, o compositor tem que ter uma cabeça muito mais aberta, para que possa fluir mais a música. Eu acho que hoje em dia está acontecendo isso. Você vê de tudo na avenida, todos os ritmos, todos os sons, todas as possibilidades”. E quanto as letras? “As letras das músicas de Carnaval sempre foram divertidas e sempre vão ser. Quando se parte do pressuposto de que a música é para o Carnaval, que você só está preocupado com o período do Carnaval, a música tem que ser divertida mesmo. Partindo do pressuposto de que a música é para o Carnaval, eu acho divertida, eu acho bacana. Tem coisas que eu não gosto, mas também não vou ouvir na minha casa, vou ouvir na rua e está tudo certo”, finaliza.

Marcio Mello: “Quando se parte do pressuposto de que a música é para o Carnaval, que você só está preocupado com o período do Carnaval, a música tem que ser divertida mesmo”. Foto: Raulino Júnior

A Expo Carnaval Brazil acontece em Salvador, no Centro de Convenções, e está na sua segunda edição. Desde o dia 24 de novembro, tem promovido reflexões sobre os carnavais do Brasil. O evento será encerrado amanhã, no Pelourinho, com um encontro de manifestações carnavalescas. Neste site, você fica por dentro da programação: https://expocarnavalbrazil.com.br/.

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“Ó Paí, Ó 2” mantém verve artística e compromisso social da primeira versão

Imagem: divulgação

Por Raulino Júnior ||DESDEnhas: as resenhas do Desde||

É sempre uma tarefa difícil dar sequência a uma obra artística quando a primeira versão dela é bem-sucedida, porque surgem dúvidas, inseguranças e medo do julgamento alheio. E também é impossível não fazer comparações entre uma e outra. Ó Paí, Ó 2 estreou ontem em todo o país e foi muito recorrente ouvir as pessoas relatarem, ao sair da sessão, que acharam a continuidade tão boa quanto o primeiro filme ou que gostaram mais da película de agora. O fato é que os roteiristas, os atores e a direção, assinada por Viviane Ferreira, conseguiram manter a mesma verve artística e compromisso com pautas sociais do anterior.

O filme é muito bom. Mesmo porque, estrategicamente, a produção não quis mexer em time que estava ganhando e alguns “tipos de cena” do passado voltaram à tona no presente, gerando identificação, riso, reflexão. Não tem erro. Lembra do esculacho antirracista que o personagem Roque (Lázaro Ramos) dá em Boca (Wagner Moura), no Ó Paí, Ó de 2007? Tem agora, com novo contexto servindo de pano de fundo e outro ator contracenando com o protagonista. A impressão que dá é que o roteiro foi seguindo uma gramática ao modo Ó Paí, Ó de ser, sem muita ousadia, para não correr risco. Como se, na sala de roteiro, a gente ouvisse o tempo todo: “Tem que ter uma cena como essa”, “Como essa aqui também”. E parece que prestou muita atenção ao clamor do público nas redes sociais, trazendo muita coisa que tinha certeza que ia agradar. Deu certo. Menos é mais. Por sinal, as frases feitas, assim como no primeiro, desfilam no segundo. Dessa vez, no enredo, a turma se junta para fazer com que Neuzão volte a ser proprietária do seu famoso bar no Pelourinho. Numa das cenas, Roque exclama: “A gente tá preocupado. A gente só é forte se a gente tiver junto. Se a gente olhar pro lado e se reconhecer”. Há o reforço da importância da coletividade em Ó Paí, Ó 2. Principalmente, como recado às comunidades negras. É preciso sempre se aquilombar.

O filme tem um ritmo lá em cima. É veloz. Não para. Dificilmente, alguém vai dormir ao assisti-lo no escurinho propício do cinema. Nesse sentido, toca em várias pautas importantes. Uma atrás da outra. Na mesma velocidade. Fala de milícias, assassinato de crianças pela mão do Estado, gentrificação, empoderamento feminino, relações homoafetivas, suicídio e saúde mental. Para esse tema, em uma sacada muito boa, é Dona Joana (Luciana Souza) quem mostra como ficou depois do assassinato dos seus filhos na primeira versão. Numa sessão de terapia com Dr. Alfeu (Luis Miranda), ao ser questionada como está por dentro, a personagem responde: “Eu ando oca”. Além dos temas citados, Ó Paí, Ó 2 aborda coisas próprias da cultura de Salvador, como a tomada do comércio no centro da cidade por coreanos, e faz uma necessária crítica à indústria da música baiana, que impede um cantor e compositor negro e talentoso de ascender. No 2, Roque está prestes a lançar sua música, mas, mais uma vez, se torna vítima da crueldade de racistas e do racismo estrutural.

O longa é preciso. Nos dois sentidos da palavra. Diverte, emociona e faz a gente pensar. Uma marca do (e no) trabalho do Bando de Teatro Olodum. O único senão diz respeito a um problema na montagem. As gravações da parte 2 começaram em 2018, na Festa de Iemanjá daquele ano, pois o filme seria lançado em 2019. As cenas foram aproveitadas e a caracterização dos personagens está bem diferente. Reginaldo (Érico Brás), por exemplo, aparece durante todo o filme de dreadlocks e, nessa passagem da história, quando alguns personagens estão no Rio Vermelho, está de cabelo curto. É um grão de areia dentro da grandiosidade do filme, mas que compromete o trabalho da parte técnica. A cena não poderia ser a lembrança de algum personagem sobre a festa passada, pensando na expectativa da festa presente, que é importante na narrativa da segunda parte? Fica a pergunta. O fato é que Ó Paí, Ó 2 deixa todo mundo com vontade de ver o 3, o 4, o 5, o 6…

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Sem Edição| Ada Tem de Tudo, Antiguidades, Arte e Cultura

A descontraída e peculiar Ada Tem de Tudo. Foto: Raulino Júnior

Neste episódio do Sem Edição, conteúdo audiovisual do Desde, a convidada é Iraci Brandão Cajado, a “Ada Tem de Tudo”, figura muito peculiar de Salvador. Na conversa, ela fala sobre a origem do apelido, sobre como começou a colecionar e vender antiguidades. Cita também as participações que fez na televisão e as tietagens ao longo da vida. Para isso, abre, literalmente, o seu álbum de fotografias. Ada conta como é a dinâmica de empréstimo de seus objetos para produções culturais (peças de teatro, filmes, novelas) e fala de sua família em Amargosa, sua cidade de origem. No final, diz qual é o seu sonho mais imediato e mostra algumas das peças de sua loja. Não deixe de ver!

Agradecimentos mais que especiais a Ada! Obrigado pela confiança e disponibilidade! Você é um símbolo de Salvador! Mais sucesso!

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