Em 1982, Caetano Veloso lançou o disco Cores, Nomes, em que há a canção Queixa e, como é próprio dos artistas geniais, na letra, ele já chamava a atenção e prenunciava algo que começa a ser debatido com mais intensidade nos dias de hoje: a responsabilidade afetiva. Nos primeiros versos de Queixa, Caetano, que é o autor da obra, diz: “Um amor assim delicado/Você pega e despreza/Não o devia ter despertado/Ajoelha e não reza”. Que ninguém é de ninguém e que deixar de gostar faz parte da natureza das relações amorosas, não é segredo nem pode ser alvo de julgamentos. Contudo, o que estamos fazendo para não machucar a outra parte da relação? Falamos realmente sobre o que estamos sentido ou deixamos a coisa “em suspenso”, sem nenhuma definição? Você já pensou sobre isso, sobre o que incita no outro afetivamente?
A falta de responsabilidade afetiva provoca o descarte de pessoas, que é muito cruel e demonstra uma falta de humanidade sem tamanho. Isso, certamente, não é de agora, mas agora ficou mais evidente, principalmente com o advento das redes sociais digitais, em que tudo é mais superficial, tendo os aplicativos de relacionamento como o símbolo maior desse fenômeno. Essa superficialidade se reflete nas relações amorosas. A busca por prazer momentâneo faz com que as pessoas colecionem amores por aí, despertem sentimentos nas outras e só. Não há uma preocupação nem com os próprios sentimentos nem com os dos outros. A lógica, se é que existe lógica nisso, é a do descarte. É preciso transformar essa realidade, independentemente se houve um “contrato” ou não daquela relação que acabara de iniciar e que, estranhamente, já caminha para o fim. Responsabilidade é importante.
Querer ter prazer aqui e acolá, no fundo, denota como a solidão está presente na vida de quem não tem responsabilidade afetiva. Em geral, são pessoas que, ou vivem na clandestinidade, por motivos pessoais, que cabe a todo mundo respeitar, ou levam o “ninguém é de ninguém” muito a sério, ao pé da letra. No final, esse comportamento revela como essa busca é oca e sem sentido, uma vez que todo prazer passa. E o que é que fica? Nada.
Relacionamentos superficiais, busca de prazer momentâneo, falta de responsabilidade afetiva: isso tudo também é violência. Às vezes, a gente não percebe o quanto o nosso comportamento é nocivo para o outro. Respeito e responsabilidade devem fazer parte de todos os âmbitos da nossa vida. Inclusive, o amoroso. Num mundo de friezas, qualquer calor é bem-vindo, não importa o cobertor. Aí está o erro. Para quem já foi vítima dessa sanha, amor próprio é bom e não faz mal. “Um amor assim violento/Quando torna-se mágoa/É o avesso de um sentimento/Oceano sem água”.
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*: versos da música Queixa, de Caetano Veloso. Ouça: