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Chegar em casa

Crédito da imagem: Emoji Terra

Por Raulino Júnior ||Desde Já: as crônicas do Desde||

Não há nada melhor do que chegar em casa. Depois de um dia de trabalho cheio de desafios, muitas responsabilidades e prazos para cumprir, chegar em casa é um bálsamo. É encontrar-se consigo no lugar mais íntimo do mundo para você. A sensação é a de que todos os problemas ficam do lado de fora da porta e que você ganha mais uma chance para se reconectar. É um alívio.

Casa é refúgio. É lugar de abrigo e de amor. Você sai com a sua turma, visita parentes, fica o dia todo na rua, mas, quando chega em casa, não quer mais nada. Quer só ficar ali, de pernas para o ar, descansando e pensando nas coisas que fez. Claro que, por causa da rotina maluca que a gente vive, muitas vezes, não podemos chegar em casa e não fazer mais nada. É uma pena.
Mas, vamos pensar na alegria que é chegar em casa. Há uma satisfação quando a gente bota o pé no piso e abre a porta. A casa pode estar uma zona, toda desorganizada, uma bagunça total, mas nada tira a sensação de prazer ao chegar no seu lugar de conforto, no seu carinho de concreto, no seu ninho.
Chegar em casa é uma terapia. Faz um bem danado. Você fica descalço, à vontade, recebendo toda a energia positiva do único lugar do mundo que você pode chamar de seu. Independentemente de ser o proprietário ou não, a casa é sempre sua. No refrão da música A casa é sua (Arnaldo Antunes/Ortinho), Arnaldo Antunes canta: “A casa é sua/Por que não chega agora?/Até o teto tá de ponta-cabeça porque você demora/A casa é sua/Por que não chega logo?/Nem o prego aguenta mais o peso desse relógio”. A casa é sua. Chegue logo e aproveite o tempo que passa nela.
Sigamos.
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Cultura, Jornalismo Cultural, Música, Reportagem, Reportagem Especial, Samba

Homenagem a Riachão reforça grandiosidade do artista

Sambista foi homenageado por amigos e admiradores em seminário no IGHB

Riachão: artista ganhou merecida homenagem no IGHB, em Salvador. Foto: Raulino Júnior

Por Raulino Júnior ||Reportagem Especial|| 
“O samba é Deus e Deus é o samba. O samba é alegria, é vida, é ternura, é tudo de bom. O samba é Deus, Deus é a música. O samba, para mim, é Deus. Nada melhor do que Deus. Então, a música está, realmente, no coração de toda a humanidade”. Foi assim, ao ser indagado o que era o samba, que o próprio Riachão, 97 anos, abriu o seminário Eu sou o Samba, realizado em sua homenagem, na tarde de ontem, no Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB), em Salvador. Com seu jeito peculiar, o sambista encantou a todos com a alegria e vivacidade de sempre. Para a homenagem, o IGHB reuniu um time de admiradores de Clementino Rodrigues (nome de batismo de Riachão): Roberto MendesAlessandra CarvalhoJuliana RibeiroÊnio Bernardes e Chocolate da Bahia.

Da esquerda para a direita: Alessandra Carvalho, Juliana Ribeiro, Riachão, Roberto Mendes e Enio Bernardes. Foto: Raulino Júnior

Roberto Mendes falou sobre a origem do samba e sobre o samba chula. No final da apresentação, cunhou: “O samba é Deus de barriga cheia”. Concordando, assim, com as palavras do homenageado. Em seguida, foi a vez de Juliana Ribeiro reverenciar o mestre Riachão (a cantora e todos os convidados se referiram assim a ele, o tempo todo). Ela abriu a exposição com um áudio de Retrato da Bahia, uma das composições mais conhecidas do cantor. Enquanto a música era reproduzida, Riachão se balançava na cadeira onde estava sentado, feliz da vida. No seminário, Juliana falou sobre as histórias dela com o artista e os encontros proporcionados pela vida artística. O primeiro, por exemplo, foi em 2009, num show durante a Festa de Santa Bárbara. A cantora destacou a generosidade e vitalidade de Riachão: “Essa vitalidade ele tem sempre. Está sempre disposto, sempre disponível. Ele também é muito generoso. Não existe um momento de cantar. Ele está sempre cantando. Não para nunca”. Além disso, Juliana pontuou o fato de Riachão colocar a mulher, na própria obra e na vida, num lugar sagrado: “Ele tem noção de equidade de gênero e conseguiu transmutar o machismo, lembrando que é um homem que nasceu no início do século 20. Por decisão própria, não canta mais ‘Vá morar com o diabo‘”, explicou. No final, Juliana colocou Até Amanhã para tocar, Riachão deu canja e aproveitou para cantar também Somente Ela.

Chocolate da Bahia (nome artístico de Raimundo Nonato da Cruz) fez uma verdadeira intervenção durante o seminário. Contou histórias de sua vida, falou da importância que Riachão teve para o início de sua carreira e cantou algumas de suas músicas e jingles. No final, entoou Cada Macaco no seu Galho, para alegria do homenageado. Alessandra Carvalho, filha de Chocolate, trouxe um tom mais acadêmico para o seminário, ao apresentar informações da sua dissertação de Mestrado, defendida em 2006. Na ocasião, falou sobre o contexto histórico do nascimento do samba e desmistificou a ideia de que o samba foi prontamente aceito na sociedade da época: “A história que descobri, pesquisando sobre o samba, é uma história de muita luta, exploração, fome e pobreza”, elucidou. Enio Bernardes contou um pouco de sua relação com o samba e mostrou-se preocupado com a preservação desse patrimônio cultural. Ao falar de Riachão, choveu no molhado: “Você chega na casa dele, a primeira coisa que ele fala, depois que a gente cumprimenta, é: ‘Já comeu? Já bebeu?’. É um cuidado, uma generosidade que não tem tamanho”.

Roda de Bambas

Na homenagem, o que não faltou, obviamente, foi samba. Tanto o homenageado quanto os artistas convidados cantaram músicas do gênero e transformaram a sede do IGHB numa típica roda de samba. E roda de samba que se preze tem que ter muitas histórias. Riachão aproveitou para contar as dele. Contou, por exemplo, como fez a sua 1ª composição, em 1936, aos 25 anos de idade: “Saí da alfaiataria com destino à Ladeira da Misericórdia, para comprar material de trabalho. Vi um pedaço de papel de revista no chão, peguei e estava escrito: ‘Se o Rio não escrever, a Bahia não canta’. Aquilo não saiu da minha cabeça. No dia seguinte, compus a música”, recorda. No vídeo abaixo, você escuta trecho do samba, que não tem nome.

Exclusivamente para o Desde, o sambista falou como foi receber a homenagem promovida pelo IGHB.

O cantor e compositor Roberto Mendes falou sobre a marca que Riachão deixa para o mundo, não só para o samba, e revelou: “Se um dia Deus me permitir voltar, quero ser Riachão”. Veja o vídeo abaixo.

Artista, digamos, da nova guarda do samba, a cantora e compositora Juliana Ribeiro disse que participar da homenagem para Riachão foi fundamental. Segundo ela, artistas como Riachão abriram caminho para ela e para tantos outros: “Se não tivesse Riachão, como é que eu estaria aqui?”. No vídeo abaixo, você confere a declaração de Juliana.

Para finalizar o seminário, uma roda de samba só com músicas de Riachão reuniu bambas de todas as etnias, idades, gêneros e credos, como o homenageado gosta.

Homenagem acabou em samba. Foto: Cleide Nunes

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#Desde8, Cultura, Jornalismo Cultural, Leitura, Literatura, RauLendo: leituras em pauta

O Caso Escola Base e a falta de uma regra básica do Jornalismo

Escola Base: caso marcou a história do jornalismo brasileiro. Imagem: site da Editora Casa Flutuante

Por Raulino Júnior ||RauLendo: leituras em pauta|| 

Não precisa fazer nenhuma pesquisa para afirmar que, de 1994 para cá, é quase impossível ter um estudante ou profissional de Jornalismo, no Brasil, que não conheça o Caso Escola Base. Se tem, as faculdades estão falhando. O emblemático episódio começou a figurar nas manchetes dos jornais, rádio e TV em março daquele ano e, por falta de um requisito básico da prática jornalística, a apuração, “matou” socialmente seis pessoas. Explico: Icushiro ShimadaMaria Aparecida Shimada e Paula Milhim, donos da Escola de Educação Infantil Base, localizada em São Paulo, foram acusados de abuso sexual por Cléa Parente e Lúcia Tanoue, mães de estudantes da instituição. Além deles, Maurício Alvarenga (marido de Paula e motorista do transporte escolar) e o casal Mara França e Saulo Nunes (pais de aluno da Escola Base) também foram acusados de fazer parte de um suposto esquema de pedofilia. O fato é que a imprensa, capitaneada pela Rede Globo, dona do furo jornalístico (Cléa e Lúcia entraram em contato com a emissora com o objetivo de que a denúncia não deixasse de ser investigada e, claro, buscando uma notoriedade para o caso), tomou a queixa das mães como verdade e uma série de reportagens que exploravam o episódio de forma sensacionalista foram veiculadas a partir de então. O estopim foi a reportagem da Globo, conduzida por Valmir Salaro, no Jornal Nacional, em 29 de março de 1994. A única “prova” sobre o “crime” que os jornalistas tinham era o depoimento das mães e as declarações de Edélcio Lemos, delegado do caso, que também deixou de cumprir a sua função com responsabilidade. Por falta de provas, o inquérito foi arquivado, mas os acusados ficaram com marcas que ressoam até hoje.

No intuito de descobrir como o caso marcou a vida dos envolvidos, o jornalista e editor-chefe do portal Casa dos FocasEmílio Coutinho, lançou, em 2016, o livro-reportagem Escola Base: onde e como estão os protagonistas do maior crime da imprensa brasileira (Editora Casa Flutuante, 135 páginas). Com prefácio de Heródoto Barbeiro, a obra traz um significativo trabalho de investigação de Emílio. Em dez capítulos, o jornalista descortina a história e mostra para o leitor o que aconteceu com as pessoas que participaram diretamente dela. A narrativa é interessante e quem lê se coloca o tempo todo no lugar de Coutinho, na difícil jornada de busca dos personagens, uma vez que, na época de lançamento do livro, o episódio já tinha 22 anos de ocorrido. O casal Shimada, por exemplo, já morreu. E será que todo mundo quis falar sobre o caso ou, como alguns jornalistas que cobriram, na época, as pessoas preferiram o silêncio? No livro, Emílio Coutinho narra todas as aventuras para colher os depoimentos e consegue uma entrevista exclusiva com Valmir Salaro, um dos poucos profissionais que reconhecem o erro. A leitura vale a pena.

Em tempo: Emílio Coutinho está prestes a lançar mais um livro sobre o caso, mas com outra perspectiva. Trata-se de O Filho da Injustiça, parceria do jornalista com Ricardo Shimada, filho do casal Shimada. De acordo com uma postagem do próprio Emílio, no portal Casa dos Focas, o livro “mostrará outro aspecto dessa história e colocará o leitor na pele de umas das vítimas mais próximas da Escola Base”. Vamos aguardar.

Referência:

COUTINHO, Emílio. Escola Base: onde e como estão os protagonistas do maior crime da imprensa brasileira. São Paulo: Editora Casa Flutuante, 2016.

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