Artigo de Opinião, Cultura, Jornalismo Cultural

A cultura do “vamos fazer”

Imagem do Aratu Notícias, da TV Aratu, de 28/4/2015. Foto: Raulino Júnior

Após tragédias, como a que ocorreu em Salvador na segunda-feira, 27 de abril de 2015, em decorrência da chuva, as reportagens de TV são sempre muito parecidas, os cenários onde o caos bate mais forte são sempre os mesmos e o discurso das autoridades é sempre o do “vamos fazer”. Por que não fizeram antes? Não foi por falta de aviso! Mesmo porque, casos semelhantes já tinham acontecido.

Político é um ser plastificado. Está ali com uma retórica que é reprodução da reprodução da reprodução… Nada é. Tudo “pode vir a ser”. ACM Neto, prefeito de Salvador, concede entrevista a uma emissora de TV e afirma que “a prefeitura vai amparar as famílias que perderam seus entes queridos e seus pertences. Inclusive, dando um auxílio de até 3 salários mínimos (R$ 2.364)”. Falou algo do tipo. Ajuda? Ajuda. Resolve? Claro que não! Tenho certeza de que a equipe dele entende muito mais do riscado do que nós. Sabe que o problema ali é estrutural e que a proposta de solução deve ser mais abrangente, pensando em evitar que o futuro repita o passado. Cazuza sabia das coisas.
Deve-se pensar numa política que evite que as pessoas ocupem terreno de relevo acidentado para construir as suas casas. Em contrapartida, o governo deve apresentar boas alternativas para alocar essas famílias.
Mas, voltemos ao objeto deste artigo de opinião, que é o discurso. Do político, especificamente. Sempre tão semelhante! Eles sobem e descem o olhar, enfatizam uma palavra aqui e outra acolá e, impressionantemente, sabem colocar a frase certa, no momento certo. Isso é treino! Infelizmente. Eles seguem os comandos à risca. No caso de tragédias, será que até o olhar de comiseração faz parte da cultura? Do costume? Seria demais!
Enquanto o discurso do “vamos fazer” não for substituído pelo o do “vamos fazer, fazendo”, algo próprio da nossa cultura sempre vai existir: o comodismo. O discurso do político é sempre cômodo. E a gente sabe para quem! Isso incomoda.

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Cultura, Desde Então: análise de produtos culturais de outrora, Forró, Jornalismo Cultural

Gravado ao vivo: o caso Mastruz com Leite

Capa do 1º CD ao vivo da banda Mastruz com Leite: um clássico. Imagem: reprodução do site Forró das Antigas

Por Raulino Júnior ||Desde Então: análise de produtos culturais de outrora||

Na década de 90, do século passado, a indústria fonográfica do Brasil apostou num novo gênero de álbum: o “ao vivo”. Vários cantores e bandas entraram nesse filão e lançaram os seus trabalhos. É que o CD gravado “ao vivo”, além de ter sido uma novidade para a época, era garantia de sucesso. O formato reunia poucas músicas inéditas, mas resgatava aquelas canções do repertório do artista que todo mundo gostava e sabia cantar. Então, não tinha erro. É praticamente o que alguns artistas da cena atual da música fazem ao gravar um DVD atrás do outro. Ou seja, na falta de criatividade, lança-se um “museu de grandes novidades”.

A banda cearense Mastruz com Leite gravou o seu em 1997, no Parque de Vaquejada da Fazenda Mastruz com Leite, em Pentecoste, no Ceará. O disco, que é um clássico na história do grupo, saiu pelo selo SomZoom Studio e teve direção artística de Emanoel Gurgel (o mentor da banda). De fato, a gravação ficou muito boa. Isso se deve pela escolha do repertório e pela competência dos vocalistas daquela formação: Kátia CileneFrançaAduilio MendesBete Nascimento e Tony Silveira. De acordo com informações do site Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira, o CD vendeu um milhão e meio de cópias.

O álbum começa com um pot-pourri vibrante, que inclui as músicas Na Ponta do Pé e Forrobodó, ambas de Luiz Fidélis. A partir daí, a sequência musical faz o ouvinte se sentir naquele show, que foi gravado nos dias 5, 6 e 7 de setembro. Ao todo, Mastruz com Leite Ao Vivo I tem 21músicas. Canções como Rock do Sertão (Luiz Fidélis), Meu vaqueiro, Meu Peão (Rita de Cássia), Leito da Saudade (Ferreira Filho/Rômulo César/Cláudio Mello), Meu Estrangeiro (Rita de Cássia) e Flor do Mamulengo (Luiz Fidélis) figuram na obra. Destaque também para Meio-Dia (Luiz Fidélis/Danilo Lopes), sucesso do CD Rock do Sertão, de 1994. Na letra, um discurso forte, que fala de seca, dificuldades e esperança. O pot-pourri com Filha do Sol e Os Dez Mandamentos, as duas compostas pela dupla Dadá di Moreno e Jeová de Carvalho, merece ser ouvido, e com empolgação. O xotezinho Noda de Caju (Luiz Fidélis) é outra preciosidade do disco. A obra termina com mais um pot-pourri, dessa vez incluindo as divertidas músicas Cabeça com Bob’s (Eliezer Setton/Elizete Setton) e Barriga Crescida (Eliezer Setton).

Atualmente, a Mastruz com Leite não é nem de perto aquela banda que fazia um forró com dedicação, fincado nos ensinamentos de Luiz Gonzaga. Hoje, o grupo é congênere da péssima Avioẽs do Forró (é bem difícil encontrar o forró ali). Fica a lembrança.

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Crônica, Cultura, Desde Já, Jornalismo Cultural

O vilão

Foto: Raulino Júnior

Por Raulino Júnior ||Desde Já: as crônicas do Desde||

Ele está em todo canto. E eu acho que tenho medo dele. Fico trêmulo! Está em dez, de cada dez cidades brasileiras. Se a gente acordar cedo, vai se encontrar com ele. De tarde e de noite, também. No meu caso, só até o início da noite. Graças a Deus! Em casa, fico em paz. Para mim, ele é vilão. Sempre!

Posso assegurar: hoje, não existe repartição sem ele. É o mundo moderno (“muderno!”). É um pouquinho de Europa aqui? Será?! Eu não quero me europeizar! Mas é difícil, amigos. Muito difícil! Mesmo porque, ele me persegue. Vixe! Muitos alegam, dizem que a culpa é da queima de combustíveis fósseis. Balela!

Para mim, é hábito. Na verdade, tudo é hábito. Antes, não tinha isso. Não precisávamos dele (e eu ainda não preciso!). Hoje, todos acham essencial. Eu não acho! Por causa dele, meus dentes viram uma ala de bateria de escola de samba. Fico chateado! Não rendo! Minha voz quase não sai! A vontade que dá é de tacar pedra nele e provocar um acidente. Ou seria incidente? Eta! Isso não é importante! O fato é que a minha educação, muitas vezes, não me deixa agir como eu penso. Agradeça, aparelho de ar-condicionado!

Sigamos.

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Cultura, Jornalismo Cultural, Notícia

Shopping Piedade promove Festival de Cultura

Foto: reprodução do site do Shopping Piedade

Por Raulino Júnior

Shopping Piedade está promovendo o seu primeiro festival de cultura. O evento começou no dia 9 de abril e segue até o dia 25. Durante esse período, comerciantes, clientes e transeuntes vão acompanhar uma programação diversificada, envolvendo várias linguagens artísticas, como música, dança, teatro, grafite, fotografia e literatura. As apresentações acontecem na Praça do Coração, que fica no 1º piso do centro de compras.

Trupe de Teatro 4.com, do Engenho Velho de Brotas, em cena do espetáculo Corpo e Alma em Verso e Prosa, na manhã deste sábado. Foto: Raulino Júnior

Festival de Cultura Shopping Piedade faz parte das comemorações de 30 anos do lugar, comemorados em 2015. “Ao longo desses 30 anos, o Shopping Piedade sempre se preocupou em dar espaço para a cultura, com apresentações musicais, de dança e até na valorização da cultura regional. O São João daqui é sempre forte, a gente traz repentistas, sanfoneiros, bandas e trios de forró”, afirmou Pablo Vieira, 33 anos, gerente de marketing do shopping. De acordo com ele, o principal objetivo do festival é o de dar visibilidade para grupos que desenvolvem ações culturais nas comunidades de Salvador. “A ideia é dar espaço para grupos que desenvolvem trabalhos em comunidades, para eles se apresentarem para um público maior. Às vezes, você tem um trabalho muito bacana, de excelente elaboração, mas que fica restrito à comunidade na qual é desenvolvido”.

Cris Santana e Pablo Vieira: equipe do Festival de Cultura Shopping Piedade. Foto: Raulino Júnior

A curadoria ficou sob responsabilidade da produtora cultural Cris Santana, 41 anos. “Foi muito difícil fazer a seleção dos grupos, porque tem muita pérola escondida nessa Salvador. Há, nos bairros, muito trabalho sociocultural, de vários segmentos: fotografia, artes plásticas, música, dança”.
Para quem se animou com a notícia, o festival vai entrar para o calendário fixo do shopping, sempre no mês de abril.
||Programação||
Abaixo, confira a programação do Festival de Cultura Shopping Piedade. A agenda de 17 a 25 de abril ainda não foi divulgada. Aos domingos e no dia 21 de abril, não haverá apresentações. A programação está sujeita a alteração sem aviso prévio.
https://www.facebook.com/ShoppingPiedade/app_190322544333196?ref=page_internal
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Cultura, Jornalismo Cultural, Reportagem

Vida de baiana que foi Miss Universo em 1968 vira livro

Biografia de Martha Vasconcellos foi escrita por Roberto Macêdo e integra a Coleção Gente da Bahia, da ALBA

Capa da biografia de Martha Vasconcellos. Foto: Raulino Júnior

Por Raulino Júnior

Martha Vasconcellos: a rainha da beleza universal é o nome da biografia escrita pelo jornalista Roberto Macêdo e lançada na tarde desta quinta-feira, na Associação Comercial da Bahia, no bairro do Comércio, em Salvador. A obra integra a Coleção Gente da Bahia, iniciativa de marketing cultural da Assembleia Legislativa do Estado da Bahia (ALBA). O objetivo da coleção é o de preservar a memória de baianos e de pessoas que, de alguma forma, têm forte identidade com a Bahia.

Cerimônia

O Salão Nobre da Associação Comercial da Bahia ficou repleto de pessoas que foram prestigiar o lançamento do livro. Martha Vasconcellos foi bastante assediada, com pedidos de fotos e entrevistas. “É muito bom ser homenageada em vida. O Roberto passou um ano e meio escrevendo o livro. Estou muito feliz com esse trabalho dele”, contou a baiana, nascida em Salvador há 66 anos (em junho, completa 67). Martha Maria Cordeiro Vasconcellos foi eleita, num mesmo ano (1968), Miss Bahia, Miss Brasil e Miss Universo. Foi a segunda (e última!) brasileira até hoje a conquistar o título  de “a mulher mais bonita do mundo”. A primeira a conseguir tal feito foi Ieda Maria Vargas, em 1963. Questionada sobre a ditadura da beleza que impera na sociedade, Martha diz não ser contra. “Eu acho que, desde que você se sinta bem fazendo plástica, ou implante, ou o que for, para melhorar, não tenho nada contra. Acho legal”.

A história de Martha é de surpreender, porque ela não quis ser apenas ícone de beleza. Foi além. Quando estava com 52 anos, resolveu concretizar um sonho: estudar psicologia. Passou oito anos trabalhando com mulheres vítimas de violência doméstica e foi premiada mais de uma vez por causa disso.

Martha Vasconcellos: hoje, no lançamento de sua biografia…

… e no passado, premiada. Fotos: Raulino Júnior

O presidente da ALBA, deputado estadual Marcelo Nilo, de 59 anos, afirmou que a Coleção Gente da Bahia nasceu para dar prioridade à área cultural, que, segundo ele, está faltando na Bahia. “A Assembleia, apesar de ser a Casa das Leis, que elabora as leis do estado, fiscaliza o Poder Executivo, criou um item importantíssimo: levar, principalmente para a juventude, as pessoas que fizeram a história da Bahia. Então, Martha Vasconcellos é um exemplo. Na década de 60, ela marcou no mundo baiano, no mundo brasileiro, no mundo internacional, pela sua beleza física e, posteriormente, pela sua beleza espiritual. Na vida política, você também tem que dar prioridade à cultura e nós já editamos e reeditamos 152 livros de pessoas que fizeram a história da Bahia”. É importante lembrar que os livros da coleção são distribuídos gratuitamente, na sede da ALBA, no Centro Administrativo da Bahia (CAB), em Salvador. Os interessados também podem adquirir as obras entrando em contato com o cerimonial da Assembleia Legislativa, através dos telefones (71) 3115-4910 ou 3115-2937.

Marcelo Nilo, presidente da ALBA: “Na vida política, você também tem que dar prioridade à cultura”. Foto: Raulino Júnior

De acordo com o deputado, o critério para escolher os autores das biografias é simples: basta procurar a ALBA. “Os autores são frutos daqueles que nos procuram. Tem uma equipe que faz uma triagem, formada pelo doutor Délio Pinheiro [Assessor para Assuntos de Cultura]  e o doutor Paulo Bina [Chefe da Assessoria de Comunicação Social]”, explica.

A assistente social aposentada, Heliana Tenuta, 58 anos, acompanha tudo da carreira de Martha Vasconcellos há 47. “Só hoje que eu tive a oportunidade de conhecê-la pessoalmente. É um prazer muito grande. Estou muito feliz”, entusiasma-se. Eliana veio de Goiânia especialmente para prestigiar o evento. “Sou de Cuiabá, mas moro em Goiânia há oito anos. Tem oito anos que eu tenho contato com a Martha por e-mail, pelas redes sociais”. E valeu a pena o esforço? Ela responde adaptando versos de Fernando Pessoa: “Sempre vale a pena quando a alma não é pequena”.

Heliana Tenuta: fã de Martha desde os 11 anos. Foto: Raulino Júnior

Com a palavra, Roberto Macêdo

Foto: Raulino Júnior

Roberto Macêdo, 53 anos, é jornalista, formado pela Universidade Federal da Bahia. Trabalhou  na TVETV AratuTV Bahia e Bandeirantes.  Nesta entrevista exclusiva que concedeu ao Desde, ele fala sobre o processo de produção da sua obra e opina sobre a polêmica envolvendo biografias não autorizadas.

Desde que eu me entendo por gente: Como foi o processo de pesquisa para fazer o livro?

Roberto Macêdo: Eu pesquisei em várias bibliotecas do Brasil, em várias coleções de revistas e jornais, pesquisei muito pela internet. Graças a Deus que a internet hoje já tem coleções de jornais do mundo inteiro. E pesquisei no material da própria Martha. Ela foi extremamente generosa, abriu a sua casa, me de deu todas as fotografias e, por último, me deu todas as cartas que ela guardou durante todos esses anos. Mais de 600 cartas. Grande parte do livro, a gente deve agradecer a essas cartas, porque era uma espécie de diário que ela tinha. Rendeu muita história interessante.

Desde: Houve algum tipo de censura por parte da Martha?

RM: Não, porque Martha é minha amiga. Eu diria, hoje, de brincadeira, que conheço a vida dela mais do que ela. Eu sei do que ela não gosta, do que ela gosta. Há um detalhe que ela não queria que tocasse. Eu cheguei para a direção da Assembleia e disse: “Ela não gostaria de tocar nesse assunto”. O pessoal da Assembleia disse que esse projeto é uma homenagem, que não quer constranger ninguém. Então, foi ótimo, porque o meu pensamento estava indo ao encontro do pensamento da Asssembleia. E assim foi. O detalhe dizia respeito ao segundo casamento dela, uma coisa que não acrescentava nada na vida dela. A gente nem tocou, só disse que ela teve um segundo casamento. Não tem nenhum problema. Martha é uma pessoa muito querida, muito amada, todo mundo fala bem dela; você só não pode pisar no calo dela. Se pisar, ela fecha o tempo.

Desde: O que você acha da polêmica em torno das biografias não autorizadas?

RM: Eu acho ridículo porque você pode me autorizar ou não a fazer a sua biografia, e eu faço. Se você tem uma vida pública, participou de várias situações com várias pessoas, por que você pode proibir que as pessoas contem essas coisas? O que eu acho que deve haver é uma justiça séria e rápida, porque se você se sentir prejudicado, você processa o biógrafo, pede uma indenização, pede para ele ser preso, faz o que quiser, pede o que quiser. Agora, o direito é a vida, é a história. Quem vai me impedir de contar uma coisa que eu vi? Ninguém!

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||Galeria||

Martha posa para foto com admiradora. Foto: Raulino Júnior

Martha entre Marcelo Nilo (à esquerda) e o presidente da Associação Comercial da Bahia, Marcos de Meirelles Fonseca. Foto: Raulino Júnior

Martha e Roberto durante a cerimônia de lançamento da biografia. Foto: Raulino Júnior

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Cultura, Dança, Jornalismo Cultural, Música, Reportagem, Reportagem Especial, Teatro

Mostra Bonfim em Cena movimenta Senhor do Bonfim

Arte: Mariana de Paula

Por Raulino Júnior ||Reportagem Especial|| 
“Cidade cultural/Primor da educação/Fator fundamental/Da sua evolução”Esses versos fazem parte de uma música cantada por Del Feliz, que tem Bonfim como temática, e se encaixam muito bem às razões de existir da Mostra Bonfim em Cena. O evento cultural que está movimentando a cidade de Senhor do Bonfim, localizada no centro-norte do estado da Bahia, a 376 Km de Salvador, tem como intuito potencializar as manifestações culturais da Capital Baiana do Forró e apresentar outras linguagens artísticas para a sociedade bonfinense. Concebida pela produtora cultural Adriana Santana, a Mostra foi contemplada pelo edital de Dinamização de Espaços Culturais, da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (SecultBA). Desde dezembro de 2014, espetáculos de dança, teatro, música e circo entraram em cena no palco do Centro Cultural Ceciliano de Carvalho. A programação segue até o final de maio.
Música e dança

Em cena, a Filarmônica União dos Ferroviários Bonfinenses e os bailarinos do Ballet Sacramentinas. Foto: Darlan Barreto

No último domingo, 5 de abril, os músicos da Filarmônica União dos Ferroviários Bonfinenses voltaram a se apresentar na Mostra Bonfim em Cena. Em dezembro, eles inauguraram o evento, com um concerto especial em tributo a Ceciliano de Carvalho (músico, compositor, maestro, pintor, fotógrafo), artista bonfinense homenageado no nome do Centro Cultural.
Na recente apresentação, que abriu o quinto mês de atividades da Mostra, a Filarmônica fez um concerto popular e prestou homenagem a compositores de Senhor do Bonfim e região. Lúcio Barbosa (autor da música Cidadão, gravada pela primeira vez por Zé Geraldo, em 1979), Zecrinha (que interpretou Cidadão, acompanhado pela Filarmônica, contribuindo para um dos momentos mais marcantes da noite), Daniel GomezTargino Gondim e Tércio Guimarães foram alguns dos homenageados.

Zecrinha canta Cidadão, de Lúcio Barbosa. Ao seu lado, o maestro Tenison Santana. Foto: Gislene Barreto

Zecrinha, de 62 anos, na música há 49, ficou feliz com o convite feito por José Egnaldo Silva, o Miranda, um dos maestros da Filarmônica. “Foi muito legal! Não é, assim, o gênero de música que eu faço; eu faço MPB até mais estudada, mas foi bom. Uma canção de um bonfinense, eu me comprometi a vir aqui e cantar. Eu cantei com a letra, porque não sabia decorada. Mas o convite foi feito por Mirandinha, eu achei legal e vim aqui e dei meu recado. Se vocês gostaram, eu fico muito lisonjeado”.
Ballet Sacramentinas, formado pelos bailarinos Alexandre MagalhãesCleideanne CezárioNara Junqueira e Rafaela Bonfim, fez uma participação especial durante o concerto, apresentando três coreografias. “O Ballet Sacramentinas tem uma história muito bonita, no decorrer desses 16 anos de existência aqui na cidade. Quando eu recebi o convite para trazer o Ballet como representanção de dança, na Mostra Bonfim em Cena, foi uma expectativa tamanha”, declarou Alexandre, 25 anos, ao ser indagado sobre a importância de partcipar do evento.
Quem também reconheceu a Mostra como uma ação importante para a cidade, foi o autônomo Marco Antonio, de 60 anos. “A cultura aqui em Bonfim estava morta, devido aos políticos, que não estavam dando apoio, principalmente o nosso PT, que eliminou a cultura bonfinense. Agora, com esse movimento, está sendo resgatada”, pontuou. Marco também elogiou a apresentação da Filarmônica. “Ela é um espetáculo. Várias gerações, da década de 60 pra cá, não acompanharam isso, não tiveram a oportunidade e, hoje, estão tendo essa oprotunidade de ouvir, aqui na cidade, ao vivo, a música clássica; que poucos jovens estão ouvindo”.

Marco Antonio: “A Mostra resgatou a cultura”. Foto: Raulino Júnior

A Filarmônica

Filarmônica União dos Ferroviários Bonfinenses fará 62 anos de atividade, no mês de junho, e vai continuar comemorando o fato de ser uma das mais renomadas do ramo. Na trajetória, coleciona apresentações em lugares emblemáticos da Bahia, como o palco do Teatro Castro Alves (TCA).

Sede da Filarmônica União dos Ferroviários Bonfinenses, em Senhor do Bonfim. Foto: Raulino Júnior

De acordo com o presidente da sociedade, Rafael Ribeiro, de 29 anos, que está há quase 14 no grupo, a tônica da Filarmônica é, principalmente, formar músicos cidadãos. “A Filarmônica é uma instituição da comunidade. Ela está inserida na sociedade bonfinense para instruir, para formar, para educar; não só musicalmente, mas educar na formação cidadã do jovem bonfinense. Então, tem esse foco, tem esse objetivo. A banda da Filarmônica é só uma parte, mas ela também tem uma escola; e a escola é que é o importante. O objetivo principal é educar através da música”, esclarece. Rafael toca saxofone (alto, barítono, tenor e soprano) e está no início de sua gestão na Filarmônica, para um mandato de dois anos. “Eu só espero contribuir”, fala com confiança.

Rafael Ribeiro: “A Filarmônica é da comunidade”. Foto: Raulino Júnior

A formação cidadã a que Rafael se refere fica evidente quando se escuta o discurso de Lara Camila, 15 anos, que toca clarinete. “A Filarmônica é crucial na vida de todos os adolescentes e jovens, porque ela prega a educação em primeiro lugar. Faz mais de quatro anos que eu estou aqui e é a minha segunda família, meu segundo lar. É como se eu tivesse vários irmãos em um só lugar. A sensação é maravilhosa”, reconhece. Contudo, a adolescente não pretende seguir carreira na música. Eu quero ser médica, só que eu vou ter um hobby“.  A estudante faz questão de destacar que todo o ensinamento que recebe é de graça, bem como os instrumentos e as roupas.

Lara Camila: “Aqui é meu segundo lar, minha segunda família”. Foto: Raulino Júnior

O maestro Tenison Santana, 26 anos, afirma ter sentido “uma satisfação muito grande” ao se apresentar novamente na Mostra Bonfim em Cena. “Poder replicar os conhecimentos que a gente aprende fora daqui de Bonfim com os nossos colegas, como o nosso professor, que é o Miranda, é uma satisfação porque a gente pôde, além de fazer esse trabalho com o pessoal da Filarmônica, citar compositores vivos daqui da cidade, que são nomes bastante conhecidos; com canções bastante conhecidas e poder homenageá-los presentes aqui na plateia. É uma emoção até muito grande para a gente que faz parte da Filarmônica, que está acostumado a tocar peças de compositores que já faleceram. Além de tudo, peças populares, para mostrar que a Filarmônica tem uma grande versatilidade. Tanto toca peças eruditas como toca peças populares também, principalmente o forró, já que estamos tratando da Capital Baiana do Forró”. Tenison é graduado em trombone pela Escola de Música (EMUS) da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e está prestes a concluir o mestrado em Educação Musical, também pela EMUS.

E quais serão os pŕoximos acordes da Filarmônica? Rafael Ribeiro responde: “Temos muitos projetos na cabeça e alguns até no papel também. Participamos, agora, de um edital lançado pelo Fórum daqui para rodar a região de Senhor do Bonfim e distritos, levando música para os bairros, para a população mais carente e áreas de maior vulnerabilidade social e maior criminalidade. A gente espera também firmar uma parceria com a ferrovia. Somos uma Filarmônica oriunda dos ferroviários e a Ferrovia Centro-Atlântica (FCA) começou, agora, a despertar para a área social. Então, esperamos nos unir como parceiros para desenvolvermos trabalhos na área de música e de formação de jovens. Esses são os  passos para 2015″.

Com a palavra, Adriana Santana

Foto: Raulino Júnior

Adriana Santana tem 23 anos e é autora do projeto que deu origem à Mostra Bonfim em Cena. Formada em Produção em Comunicação e Cultura, pela Faculdade de Comunicação (FACOM) da UFBA, a bonfinense realizou uma vasta pesquisa, em 2013, sobre gestão e uso de equipamento cultural no interior, tendo o Centro Cultural Ceciliano de Carvalho como objeto. Da apresentação do Trabalho de Conclusão de Curso à aprovação no edital de Dinamização de Espaços Culturais, da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (SecultBA), foi um pulo. Em entrevista exclusiva para o Desde, ela conta um pouco sobre a realização da iniciativa.

Desde que eu me entendo por gente: Na sua opinião, como idealizadora do projeto, qual é a importância dele para a cultura de Bonfim?

Adriana Santana: Ele é muito importante para movimentar um espaço cultural da cidade, da região, o único centro de cultura do Território Piemonte Norte do Itapicuru que não tem atividades permanentes de cultura. Tem esse nome de espaço cultural, mas recebe mais atividades de outra natureza do que da natureza artístico-cultural. Então, é muito importante movimentar este espaço. É muito importante promover entretenimento e lazer para o público da cidade, da região. E tem sido muito bacana fazer isso. A gente chegou, agora, à oitava edição neste domingo [dia 5 de abril], aí vamos até maio realizando um monte de coisa.

Desde: O projeto tem atendido às suas expectativas iniciais?

AS: Sim. Acho que a gente tem conseguido trazer programação de muita qualidade, tem sido uma surpresa a cada noite. Porque, quem vê de fora, acha que não tem tanta gente boa fazendo arte aqui na cidade e a gente mostra que não; que é o contrário.

Desde: E qual o legado você quer que a Mostra Bonfim em Cena deixe para a cidade, para a região?

AS: Eu quero que, após seis meses de programação contínua, o Centro Cultural consiga receber atividades contínuas daqui pra frente. Que as pessoas entendam a importância de ter atividades aqui, de realizar atividades, que o poder público entenda a importância disso e continue realizando, não deixe esse espaço parado, como estava antes da Mostra Bonfim em Cena.

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Esta reportagem foi produzida nos dias 05, 06, 07 e 08 de abril de 2015
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