Artigo de Opinião, Opinião

“Sou jornalista…”

“Sou um banana”. Foto: reprodução do site Beleza e Saúde

Jornalistas se acham, pela própria natureza da profissão (Argh!). Entretanto, não deixa de ser reconfortante testemunhar, com a ajuda das tecnologias atuais, quando alguém coloca esses profissionais no lugar de onde eles nunca deveriam ter saído: o de informar com responsabilidade. Ponto. Essa é a principal função do jornalista. O contrário é maquiagem que se usa em eventos sociais: subterfúgio para disfarçar uma constatada imperfeição. O episódio envolvendo o técnico do Esporte Clube VitóriaVagner Mancini, e o jornalista da Rádio BandeirantesFelipe Garraffa, só serve para constatar como o jornalismo está infectado pelo vírus da arrogância e da presunção.

Ontem, após a partida entre o Vitória e o Corinthians, na qual o time baiano saiu vencedor, Mancini concedeu uma entrevista coletiva e se deparou com a evidente parcialidade de Garraffa em relação ao desempenho dos clubes no jogo. Houve uma tensão entre o técnico e o jornalista. Mancini retrucou o que chamou de “visão equivocada” de Felipe. Este, por sua vez, trouxe dados que faziam sentido apenas para ele. Contudo, o que chama atenção no caso, além da sofrível prática jornalística, é o vírus que está inoculado em quase todos os analistas do cotidiano: o de estar (ou achar-se) acima do bem e do mal. Ao ser hipoteticamente chamado por Mancini de corintiano, Felipe respondeu: “Não. Sou jornalista”, demonstrando, assim, uma arrogância tão presente no universo dos jornalistas quanto a escolha da pauta do dia.

Por sinal, justificar qualquer estupidez com a oração “Sou jornalista” é a atitude mais arrogante que tenho visto nos últimos tempos. “Coisão” ser jornalista, não é?! Para alguns, é. Mas, o que muitos profissionais esquecem, ou fingem esquecer, é que o jornalismo é apenas mais uma atividade profissional que existe na sociedade. Ela não é melhor nem pior. É mais uma. Jornalistas não são sabichões, não estão acima do bem e do mal, nem determinam, com a visão subjetiva dos fatos, como as coisas devem ser. É uma ilusão pensar isso. Principalmente, nos dias de hoje, com o advento das novas tecnologias da informação e da comunicação e as mudanças ocorridas na dinâmica de produção de conteúdos informativos.

Clóvis Rossi, uma leitura básica para quem está iniciando no jornalismo, afirma, no livro O que é Jornalismo (1980, Brasiliense), que “a imprensa brasileira ainda não venceu a regra não escrita de que o jornalista é um especialista em generalidade. Ou, em outras palavras, um sujeito que sabe pouco de muitas coisas”. Ou seja: por trás de um “Sou jornalista”, tem a arrogância, a presunção e o pedantismo, mas falta a consciência da verdadeira função social da profissão, além de sobrar muita imodéstia. Que o episódio com Mancini seja mais uma lição. E sem corporativismo!

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En(cruz)ilhada é um soco na cara da sociedade

Leno Sacramento em cena de En(cruz)ilhada. Foto: Rodrigo Veloso

Por Raulino Júnior  ||DESDEnhas: as resenhas do Desde||

Sabe todos aqueles estereótipos associados aos negros? Eles serviram de mote para o monólogo En(cruz)ilhada, uma intervenção política mais que necessária para os dias de hoje. Com texto e (boa) atuação de Leno Sacramento (Bando de Teatro Olodum e Ouriçado Produções), o espetáculo faz a gente refletir sobre como a sociedade vê e trata os negros, estabelecendo “lugares” e “limites” para eles.

Em pouco mais de 30 minutos de pouco texto falado, Leno aborda as encruzilhadas pelas quais os negros passam diariamente e põe a lupa em fatos que, para muitas pessoas, podem até passar despercebidos. Como o negro é tratado no ônibus, na loja, na rua, na sociedade? Em qualquer lugar, a cruz sempre pesa. En(cruz)ilhada provoca o público a pensar em como atitudes descabidas e perpetuadas pelo tempo caracterizam o racismo, que ainda tem raízes fincadas no solo brasileiro.

Tudo funciona muito bem na peça. Desde a direção precisa do jovem Roquildes Junior à disposição do cenário, em forma de cruz, ampliando a metáfora que dá título à montagem e mostrando como os negros são encurralados pelos sistemas sociais. A luz de Marcos Dede e a trilha de Gabriel Franco são elementos fundamentais no espetáculo, que chegam a “contracenar” com Sacramento. A poesia de Nelson Maca fecha a costura textual, dando ainda mais substância à dramaturgia.

O monólogo tem que ser visto por todas as pessoas que fazem parte da nossa sociedade. Principalmente, pelas preconceituosas e racistas. O soco tem que doer e fazer efeito. O espetáculo segue em cartaz todas as quartas-feiras (a partir do dia 9/8), no Teatro Gamboa Nova, com apresentações às 16h e às 20h. Os ingressos custam R$ 10 (meia) e R$ 20 (inteira).

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