Por Raulino Júnior
A sala está cheia. O professor chega e os educandos se acomodam. A aula começa. Decorridos uns vinte minutos, um estudante interrompe: “Professor, posso ir ao banheiro?”. Essa narrativa hipotética é só para ilustrar um fenômeno que acontece na sala de aula da educação básica e que, para mim, deve ser motivo de reflexão. Pedir para ir ao banheiro revela um autoritarismo implícito que nunca combinou e não deve ter mais espaço nos processos de ensino e de aprendizagem. Principalmente, num país que tem Paulo Freire como Patrono da Educação. Evocar Freire é falar de liberdade o tempo todo. Sendo assim, algumas posturas devem ser revistas. Caso contrário, a escola na modalidade EaD vai ganhar cada vez mais espaço.
Estamos em 2022 e é muito comum, durante as aulas da educação básica (falo, especificamente, do ensino fundamental e médio. A pré-escola tem demandas que justificam tal postura dos educandos), os estudantes pedirem ao professor para ir ao banheiro. Sempre que me deparo com essa situação, fico reflexivo e me pergunto: “Qual é a razão desse pedido? O que está por trás disso?”. Ter vontade de ir ao banheiro e de beber água (há também pedido para isso!) faz parte da necessidade fisiológica básica de todo ser humano. Não tem razão o pedido. É, na minha opinião, descabido. Se o educando tem sede, precisa fazer xixi ou defecar, ele deve se levantar e ir. No máximo, para ser educado, pode avisar ao professor: “Vou ao banheiro”, “Vou beber água”. Nunca pedir para ir. Pedir revela que a escola vive sob a égide do autoritarismo, que não é um lugar de liberdade. Isso é um problema. Se o pedido for negado, pior ainda. É inconstitucional! O direito de ir e vir foi desrespeitado.
Casos de autoritarismo, infelizmente, não são difíceis de encontrar no ambiente escolar. Lembro de uma turma me dizer que uma professora não deixava ninguém comer durante a aula dela. Os estudantes não podiam abrir seus salgadinhos ou biscoitos. Era proibido. O que a ingestão de alimentos durante as aulas ia interferir na prática pedagógica e no aprendizado, até hoje, não se sabe, não foi descoberto. Tal postura mais afasta que aproxima. A escola tem que ser um lugar agradável, convidativo, em que o estudante se sinta bem. Se ele sai de casa para ser perseguido, censurado, tolhido, violentado, não vai querer continuar. Isso dá vazão a discursos que afirmam que professor é dispensável. Na modalidade EaD, o educando faz tudo na hora que quer, no lugar onde quer. Nessa lógica, não precisa pedir para ir ao banheiro. Muitas vezes, o banheiro vira o ambiente de estudo. Quem já assistiu à aula no vaso sanitário ou tomando banho, entende o que eu digo.
Escola não é bagunça. A comunidade escolar não deve abrir mão de regras e de combinados para manter a ordem. Isso tudo deve ser dito aos estudantes, logo no início do ano letivo, para que eles saibam o que podem e o que não podem fazer. Afinal, formar cidadãos críticos, que saibam dos seus direitos e dos seus deveres, é a função primeira da escola. E formar para a cidadania é informar ao educando que ele tem direito de fazer as suas necessidades fisiológicas básicas sempre quando quiser, sem precisar pedir. Caso contrário, a educação libertadora de que falava Freire vai ficar só no discurso.