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A vida e a vida de Luiz Melodia

Cerimônia do 29º Prêmio da Música Brasileira faz homenagem do tamanho do talento do artista fluminense

29º Prêmio da Música Brasileira homenageou Luiz Melodia. Na foto, a atriz Leandra Leal na abertura da cerimônia. Imagem: reprodução do vídeo

Por Raulino Júnior  ||DESDEnhas: as resenhas do Desde||

Luiz Melodia vive e está entre nós. Pelo menos, essa foi a impressão de quem acompanhou, pelo Canal Brasil ou presencialmente, a cerimônia do 29º Prêmio da Música Brasileira, na qual o cantor e compositor oriundo do morro do Estácio foi homenageado. O evento, que aconteceu na última quarta-feira, 15 de agosto, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, reafirmou o talento congênito de Melodia. Idealizado e dirigido por José Maurício Machline, desde 1989, a edição de 2018 teve roteiro de Zélia Duncan (que está no posto há cinco anos), cenografia de Gringo Cardia, direção musical de João Carlos Coutinho e direção artística de Giovanna Machline. A artiz Leandra Leal abriu a noite com um lindo depoimento em que falava de seu amor por Luiz e que trazia dados da vida do cantor e coube a Débora Bloch e Camila Pitanga a responsabilidade de apresentar a tradicional premiação.
E Luiz Melodia foi reverenciado da forma que merece. Sim! No tempo presente mesmo! A sua obra provou o quanto que ele é imortal e isso foi evidenciado no Prêmio da Música Brasileira. A história de vida do cantor foi entrecortada com a entrega dos prêmios e, a cada momento, um número musical era apresentado. Todas as apresentações poderiam, por exemplo, ir para um DVD, pela qualidade artística e primor do que foi exposto. Teve Pedro LuísHamilton de Yolanda e Yamandu Costa brindando o público com uma versão emocionante de FadasXênia França e Áurea Martins interpretando Juventude Transviada com muita força e sensibilidade; Lenine e o filho, João Cavalcanti, mostrando que talento é mesmo CongênitoSalve Linda Canção sem Esperança, com CéuNegro Gato (Getúlio Côrtes), com IzaLazzo e LinikerBaby do Brasil numa versão precisa de MagrelinhaÉbano, com Fabiana CozzaDores de Amores, com Zezé Motta e Sandra de SáEstácio Holly Estácio, com Alcione e Pérola Negra, num encontro familiar de Caetano VelosoMoreno VelosoTom VelosoZeca Veloso e Maria Bethânia. Foi, abusando do clichê, lindo demais.
A cerimônia foi muito bem dirigida e repleta de poesia. Sem excesso e sem chatice, como, muitas vezes, eventos dessa natureza costumam ter. A premiação celebrou a vida de Luiz Melodia e trouxe ainda mais vida para a sua obra, com releituras tão boas quanto as versões originais das canções. O 29º Prêmio da Música Brasileira fez a voz do morro ecoar, mais uma vez, para a eternidade.
Assista, no vídeo abaixo, à cerimônia do 29º Prêmio da Música Brasileira:

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Música e contemporaneidade

Curso de MPB no CFA encerra atividades discutindo a música feita no Brasil de hoje

Carla Visi: “O povo brasileiro é muito criativo”. Foto: Raulino Júnior

O último dia do curso de Música Popular Brasileira, ministrado por Vítor Queiroz, no Centro de Formação em Artes (CFA), em Salvador, foi marcado por euforia e muita discussão. A temática principal da aula estava relacionada à produção musical dos dias de hoje. Então, os cursistas se envolveram bastante, uma vez que muitos dos artistas citados estão em atividade e a plateia acompanhou de perto a trajetória artística de cada um deles. Vítor falou de BRock, o rock produzido no Brasil nos anos 80, do século passado. Músicas e informações sobre BlitzCazuzaUltraje a RigorTitãs Legião Urbana entraram em cena. Para falar do pagode, não deixou de citar Beth Carvalho e Zeca Pagodinho. Indagado sobre se há diferença entre pagode e samba, o historiador não fugiu da roda: “O pagode está num contexto do samba. É um dos sambas. Às vezes, a gente vê uma questão de marca social: ‘Pagodeiro é ruim; sambista é bom’. Mas é mais uma diferenciação social. O pagode é uma variação do samba. Dá para dizer que o pagode é muito mais próximo do partido alto e do samba baiano”. A banda Raça Negra também foi mencionada.
A descentralização da produção musical é a grande tônica que marca a música na contemporaneidade. Nesse sentido, a ascensão do Axé Music na Bahia e a cena do Tecnobrega, no Pará, são dois exemplos que evidenciam isso. Além do universo do funk. Na aula, os estudantes escutaram músicas do Ilê Aiyê, Filhos de Gandhy, Daniela Mercury, Gaby Amarantos, Gera Samba (É o Tchan), MC G15 e MC Fioti.”Periferia consome periferia”, reforçou Vítor.
Sobre a aula de hoje, o historiador considerou como um desfio: “Foi um grande desafio falar do que estamos vivendo. Então, eu comecei na virada dos anos 70 para os anos 80. A gente está descobrindo, tateando o que é que vai permanecer e o que é que não vai. O interessante é isto: ver um processo de descentralização, de informações musicais chegando de vários centros, a partir dos anos 80. O que vai acontecer agora? É um grande pergunta!”, reflete.

Carlos Leal: “Achei o curso muito interessante”. Foto: Raulino Júnior

O jornalista Carlos Leal, 47 anos, que pesquisa música há algum tempo, achou o curso interessante: “Eu tenho um projeto de uma biografia de Xisto Bahia e várias coisas que eu já sabia, fiquei sabendo mais além do que eu imaginava, através do curso. E outra coisa também que me instigou bastante: foi chegar em casa e ouvir as músicas referências das aulas. Então, acho que eu nunca ouvi tanto Carmen Miranda, Aracy de Almeida, como ouvi essa semana. Fantástico!”.
Carla Visi, cantora, jornalista e gestora ambiental, salientou que, com o curso, ficou ainda mais evidente a criatividade do povo brasileiro.”O curso me atualizou, me fez ter contato com pessoas que gosto muito. É bom você sempre ter essas referências históricas e eu tenho muita tranquilidade, como uma artista também, em ver que o povo brasileiro é realmente esse povo muito criativo. Independe muito do fluxo do mercado também, que, apesar de ser extremamente determinante por um lado, porque somos artistas, precisamos nos manter, precisamos do sustento; por outro lado, há toda uma cena que se cria de forma muito espontânea e, por ser um povo muito criativo, ele vai driblando as dificuldades e criando das suas agruras, das suas dificuldades, do mundo marginal. E isso é semente, é adubo pra gente que ama música. O povo brasileiro é incrível e a nossa cultura é riquíssima”.
Sobre a abordagem da cena do Axé feita durante o curso, Carla opina: “O Axé é muito específico. O Axé é muito rico, como as outras correntes, os outros movimentos da música brasileira. Aí você tem que ter um semestre só dedicado à música do carnaval, ao Axé e aos seus desdobramentos”. Como parte da turma era formada por músicos e cantoras, Vítor popôs que os artistas presentes fizessem uma demonstração das variações de sambas presentes na Bahia. A aula virou um pagode, com direito a canjas de Clécia QueirozMarilda Santanna e Carla Visi.
Balanço

Último dia de aula do curso de MPB: debates e reflexões acerca da música do Brasil. Foto: Raulino Júnior

Vítor fez um balanço positivo do curso: “Achei ótimo! O pessoal é muito caloroso! Isso é bem bacana de Salvador. Então, tem uma energia, tem uma vida. Muita gente contribuindo com a aula. Isso é muito legal! É uma pena que o curso vai rendendo e a vontade é de ampliar; porque, de fato, cada aula daria um curso sozinho”. O pesquisador disse ainda que conseguiu chegar no objetivo que traçou: “O meu objetivo foi alcançado. Adorei dar esse curso. Também aprendi bastante. O meu objetivo é sempre aprender com meus alunos e também revisar bibliografia”.

Mira Matos: “O CFA está aberto para atender a todo o público”. Foto: Raulino Júnior

Mira Matos, coordenadora do CFA, também ficou satisfeita com a repercussão do curso de MPB: “O curso de Vítor foi um sucesso total. É um curso livre e, pra gente, todos os cursos são importantíssimos. Tanto os de música quanto os de dança e teatro. O Centro de Formação em Artes está aqui aberto para servir e atender a todo o público que vem aqui em busca de novos aprendizados”.

Desde fez a cobertura exclusiva de todos os dias do curso de Música Popular Brasileira, ministrado por Vítor Queiroz. Você pode ver todas as reportagens clicando aqui. Abaixo, segue uma enquete com alguns dos participantes do curso. A pergunta: para você, qual é a atual situação da MPB? Não deixe de ver!

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Uma manhã em 2018

No quarto dia do curso de MPB no CFA, Tropicalismo fica no centro das discussões

Marilda Santanna: cantora, pesquisadora de música e apaixonada pelo Tropicalismo. Foto: Raulino Júnior

Um frame do programa Divino, Maravilhoso, apresentado por Caetano Veloso e Gilberto Gil, em 1968, na lendária TV Tupi, foi o gancho para o historiador Vítor Queiroz iniciar a quarta aula do curso de Música Popular Brasileira (MPB). Isso porque o Tropicalismo, movimento cultural formado por um coletivo de artistas entre 1967 e 1968, foi um tema recorrente na aula de hoje. Mas falou-se sobre mais coisas, como o próprio Vítor faz questão de esclarecer: “Não só a Tropicália, mas da MPB dos anos 60 e 70, dos artistas mais associados à MPB: vem na cabeça Chico, Gil, Caetano, Bethânia, né? Desses artistas, ali naquele contexto, um contexto dos anos 60, de luta política por hegemonia dentro da esquerda e entre esquerda e direita, e depois de 1968, como o recrudescimento da ditadura civil-militar, um momento de desespero e de outra produção. Em geral, foi um debate bacana. Os alunos perguntaram sobre outras coisas e aí fomos completando o quadro”.
Segundo historiador, a Tropicália “era uma vanguarda bastante explosiva”. Para reforçar isso, ele colocou o famoso áudio do inflamado discurso de Caetano, durante o Festival Internacional da Canção, em 1968. “A Tropicália foi uma verdadeira descida aos infernos do Brasil”, pontua Vítor. O pesquisador ainda opinou, de forma veemente, sobre o movimento: “Considerar a Tropicália como música, é uma pena, todo mundo fazia um pouco de tudo. Achar que todo mundo concordava com tudo , é uma pena. Não se pode burocratizar a Tropicália”.

No quarto dia do curso, Vítor Queiroz fala sobre Tropicália e de toda a MPB dos anos 60 e 70. Foto: Raulino Júnior

Vítor falou um pouco sobre Nara Leão, Gal Costa, Maria Bethânia, Raul Seixas, Clara Nunes, Tom Zé, Jorge Benjor (que considera um injustiçado dentro da MPB, por não ter o prestígio que deveria ter), Joyce (outra que ele considera desprestigiada na MPB), Glauber Rocha e Elis Regina. Inclusive, ao falar de Elis, advertiu: “Cuidado com o mito Elis”. E continuou: “Ela flertou com a postura Jovem Guarda: ser alienada e gostar de ser alienada. O lado sombrio de Elis Regina é extremamente oportunista”, opinou. Obviamente, houve muita discussão sobre Elis Regina na aula. No final, venceu o indiscutível talento da cantora.
Marilda Santanna, cantora, pesquisadora de música, professora do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos (IHAC), da Universidade Federal da Bahia (UFBA), e do Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade (Pós-Cultura), saiu entusiasmada da aula: “A Tropicália, para mim, é um tema muito apaixonante. É um processo da linha evolutiva da música brasileira que quebra com uma série de paradigmas de sonoridade, mas em compensação absorve antropofagicamente uma série e referências. De Vicente Celestino às guitarras; a todo um pensamento, não só poético, mas de sonoridade, de um momento político muito conturbado. Em relação à aula de Vítor, eu estou choramingando, porque amanhã é o último dia. Ele é uma figura extremamente conhecedora da música brasileira, e mais do que isso, ele conhece também a questão histórica-social. Eu acho importante, porque a música não gravita fora de um contexto. Nada é estanque, tudo tem uma razão de ser”, avalia.
Amanhã, o Desde publica a última reportagem da série Música Popular Brasileira em Curso. Não deixe de acompanhar!
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A canção nossa do dia a dia

Curso de MPB no CFA aponta características do gênero

Larissa Caldeira: dissertação de mestrado centrada no cancioneiro de Tom Zé. Foto: Raulino Júnior

O que caracteriza uma canção? A resposta para essa pergunta foi o que norteou a aula de hoje do curso de Música Popular Brasileira (MPB), ministrado por Vítor Queiroz, no Centro de Formação em Artes (CFA), em Salvador. Na verdade, as respostas. De acordo com Queiroz, toda tentativa de conceituar algo é problemática e com a definição de canção não seria diferente. Contudo, o historiador trouxe algumas questões que ajudaram os participantes a refletir sobre tal questão: “Canção, no sentido mais amplo possível, a gente poderia falar de qualquer música que envolve letra. No sentido ultrarrestrito, será canção popular, das Américas, que depois foi para outros lugares do mundo, a canção industrial ou pós-industrial, adaptada aos três minutos dos antigos 78 rpm (rotações por minuto), adaptada ao rádio, feita pra prender a atenção do ouvinte, geralmente com uma forma narrativa. Antes do rádio, veio dos teatros musicais também em toda a América. As características são: textos poéticos-musicais circulares, em que o ouvinte é chamado a atenção. Geralmente, reflete o cotidiano do ouvinte. Agora, por que é problemático esse conceito, como qualquer conceito? Na verdade, como toda regra tem exceções, esse conceito tem um monte de exceções”, pontuou.
Durante o encontro, Vítor falou sobre a trajetória de alguns artistas do rádio, como Orlando Silva, Angela Maria, Aracy de Almeida, Dalva de Oliveira, Herivelto Martins, Emilinha Borba e Marlene. Tudo isso para que o formato de canção ficasse bem compreendido para os cursistas e também para que cada um percebesse como o cotidiano é uma temática constante nas letras dessas criações. Artistas como Tom Zé, Moreira da Silva, Marisa Monte, Bezerra da Silva, Wilson Batista, Silvio Caldas, João Gilberto, Wando e MC Orelha também tiveram suas canções analisadas, a fim de mostrar as características comuns dos formatos delas.
A jornalista e musicista Larissa Caldeira, 29 anos, opinou sobre a estratégia didática de Vítor para introduzir os conhecimentos acerca do gênero canção: “Ele estabeleceu o conceito geral do que seria canção, principalmente no que se refere ao popular, e, posteriormente, tentou trazer coisas mais específicas em relação a refrão, letra, parte A, parte B, a partir de alguns autores, a exemplo do Tatit, que a gente chegou a discutir também. Porém, eu acho que a perspectiva mais geral contribui mais para a gente compreender a música brasileira para além só de harmonia, melodia e ritmo. Porque a própria voz, a própria língua portuguesa é extremamente musical”. Larissa, que canta e toca violão, cavaquinho e ukulele, se interessou pelo curso também por motivos acadêmicos: “Estou finalizando a minha dissertação de mestrado e a minha pesquisa é sobre Tom Zé, sobre a relação dele com a crítica musical. Estou fazendo isso a partir de dois discos: o Estudando o Samba e o Estudando o Pagode. Então, quando surgiu esse curso, eu falei: ‘É uma oportunidade de pensar novas coisas, de discutir novas coisas’. Já que eu estou trabalhando com um artista complexo e tenho pensado em regimes estéticos a partir desse artista e a partir dos comentários críticos que se diz sobre esse artista, o curso me proporciona essa maneira de novas reflexões, não só a partir da minha zona de conforto, daquilo que eu já estudei ou daquilo que eu já sei. Além da oportunidade de conhecer novas pessoas, novos pesquisadores, novas maneiras de se pensar”.

Aula sobre canção provoca um rico debate em curso de MPB no CFA. Foto: Raulino Júnior

Para falar de canção, Vítor tocou em temáticas que suscitaram muito debate entre o público. “Com a aula de hoje, eu peguei dois temas que têm uma ressonância emocional muito grande no país: crime e amor romântico. Como esses dois temas mexem com nódulos emocionais, medo, amor etc., eu fui mostrando como a gente tem uma dialética entre o cotidiano, os músicos profissionais, os músicos amadores, os ouvintes, na construção de canções que falem do cotidiano. Como o crime e o amor foram vestidos de canção, nesse sentido”.
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A música brasileira e o samba como identidade

Gênero musical é destaque do segundo dia do curso de MPB no CFA

Clécia Queiroz: cantora, compositora e difusora do samba. Foto: Raulino Júnior

O curso de Música Popular Brasileira ministrado por Vítor Queiroz, no Centro de Formação de Artes, em Salvador, segue discutindo aspectos relacionados ao nosso fazer musical e hoje foi a vez de falar de samba. Para isso, Vítor fez todo um preâmbulo sobre a história do Rio de Janeiro, que, sem entrar em questões polêmicas, é o estado que marca a sedimentação do gênero impulsionado pelas tias baianas, sendo Ciata a mais conhecida. O pesquisador trouxe informações sobre o Teatro de Revista e mostrou como essa manifestação artística foi importante para a consolidação do samba e de toda a MPB. A turma ouviu modinhas, que, de acordo com Queiroz, podem ser vistas como a origem da seresta e da sofrência. Nomes como os de Chiquinha Gonzaga, Pixinguinha, Noel Rosa, Orlando Silva, Mário de Andrade, Carmen Miranda e Moreira da Silva figuraram na aula. Gêneros como samba de nego, samba de breque, lundu e chorinho foram discutidos também. Obviamente, houve muita audição de músicas, um dos pontos altos do encontro.

Curso de MPB: samba como identidade nacional. Foto: Raulino Júnior

Vítor falou ainda sobre a importância do rádio na popularização da música nacional, principalmente como estratégia no Governo Vargas. Para o Desde, ele disse qual foi o objetivo da aula sobre samba: “Hoje, é exatamente a carne do prato principal, porque é a consolidação, tanto do discurso do que seria MPB e também do samba enquanto um símbolo nacional durante a Era Vargas. São referências obrigatórias para todo mundo que vai pensar música popular brasileira”.

Clécia Queiroz, cantora, compositora, atriz e professora de dança, achou que o curso foi bem pensado e gostou da abordagem acerca do samba: “Para mim, foi fundamental fazer junções. A minha pesquisa é mais para o samba de roda, do século XIX para cá, mas, evidentemente, a relação dele com o samba carioca é bastante importante”, conclui. Clécia está preparando quarto disco e, na sua discografia, constam Chegar à Bahia (1997)Samba de Roque (2009) e Quintais (2016). Nos dois últimos, Vítor, que é sobrinho da artista, participou da direção artística.

Edson de Souza: “O samba mudou, mas não perdeu as raízes”. Foto: Raulino Júnior

O professor de música da educação infantil, Edson de Souza, 37 anos, afirmou que as informações adquiridas no curso, a respeito do samba, provocaram uma viagem no tempo. “Foi uma volta no tempo, de como o samba surgiu. Com o passar do tempo, houve algumas mudanças, mas ele não perdeu a sua raiz. Às vezes, por a gente não conhecer profundamente, a gente acaba criticando. Hoje, o professor trouxe temas importantes, dos quais eu desconhecia, como alguns autores e formas como o samba se desenvolveu durante o tempo”.

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Música Popular Brasileira em Curso

CFA inicia curso sobre a história da MPB

Vítor Queiroz no CFA: MPB em pauta. Foto: Raulino Júnior

Hoje, o Desde inicia a série de reportagens Música Popular Brasileira em Curso, oriunda do curso livre de MPB oferecido no Centro de Formação em Artes (CFA) e ministrado por Vítor Queiroz, historiador, mestre em História Social da Cultura e doutor em Antropologia. Na primeira aula, o baião e os gêneros sertanejos estiveram em pauta. Vítor também falou sobre Dorival Caymmi e provocou os participantes ao indagar: “O que é MPB?”.
A pergunta fez os cursistas refletirem sobre o rótulo e provocou um bom debate acerca do que é e de como está caracterizada a Música Popular Brasileira. “O Brasil é um país que tem uma produção de música fora do normal. A gente está imerso em música. O que eu estou chamando de MPB é música comercial brasileira, feita para vender. “Popular” no sentido de algo que é veiculado comercialmente”, explicou Vítor. Nesse sentido, logo no começo da aula, ele mostrou arquivos de programas antigos de rádio, que já evidenciavam como o caráter comercial sempre esteve presente na propagação de música. “Não devemos romantizar a MPB. Ela sempre foi comercial”, acrescenta.
Quem acompanhou a aula, fez uma viagem histórica através das músicas de Alvarenga e RanchinhoTom ZéMônica SalmasoLuiz Gonzaga e Dorival Caymmi. Isso porque Vítor fazia associações com produções do passado e dos dias de hoje, a fim de deixar evidente como a dinâmica de todo o processo de construção da MPB não mudou tanto. O professor enfatizou que estamos vivendo um momento de muitas fusões: “É muito difícil, hoje, dizer o que é samba, axé, MPB. Existe muita mistura de gêneros musicais”. Uma coisa que não muda, segundo Queiroz, é a influência de Luiz Gonzaga nos artistas que fazem forró: “Todo forró feito hoje, no Brasil, vem de Luiz Gonzaga”.

Anderson Costa: “Definir MPB é muito complexo”. Foto: Raulino Júnior

Anderson Costa, 34 anos, professor da educação básica, pesquisador e doutorando em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), avaliou positivamente o primeiro dia de curso: “É um curso bastante interessante, por retomar a história da formação da Música Popular no Brasil, desvendando coisas no debate que, de certa forma, se dá no senso comum, mas ganha profundidade a partir dos fluxos de formação da própria música. Os diálogos que acontecem durante a própria aula e as inquietações das pessoas trazem um enriquecimento e uma complexidade para o curso que, para mim, é singular e bastante importante para o meu aprendizado enquanto acadêmico e pessoa que gosta de música e de compreender a nossa história a partir da música popular”. Para ele, definir MPB é difícil e complexo: “E uma diversidade muito grande pensar em Música Popular Brasileira, mas, para mim, o que resume de forma mais genérica o que seria MPB, seria o que é que o povo brasileiro produz sonoramente, dentro de uma diversidade muito grande, dentro de diversas matrizes”.
Pelo visto, a provocação feita por Vítor no começo da aula surtiu efeito, uma vez que todo mundo percebeu o quanto é complexo definir MPB. “Hoje, eu fiquei brincando com os limites do que seria MPB, no tempo e no espaço. O que é MPB? O que está dentro? O que está fora? Uma questão: num território que teve uma transformação de um país predominantemente rural para um país predominantemente urbano, em muito pouco tempo, onde estão as músicas não urbanas associadas a rural, sertanejo, caipira? Decidi começar comendo pela bordinha do prato. Em vez de chegar direto no samba, Caetano Veloso, Clara Nunes, no centro do que seria MPB, comecei pelo o que talvez fique nas zonas de sombra”.
Veja, no vídeo abaixo, a entrevista exclusiva que Vítor Queiroz concedeu para o Sem Edição.

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Série de reportagens sobre curso de Música Popular Brasileira abre comemorações pelos sete anos do Desde

Cobertura exclusiva de curso promovido pela FUNCEB é a primeira ação do blog para comemorar aniversário

Música Popular Brasileira em curso. Imagem: divulgação

Como já foi anunciado aqui, em texto publicado no dia 1º de janeiro de 2018, o Desde está comemorando sete anos em atividade. E, como é de praxe, em todo aniversário do blog há ações especialmente pensadas para agradecer e fortalecer o vínculo com os nossos leitores, além de propor reflexões sobre o nosso universo cultural. Dessa vez, não vai ser diferente: vamos produzir a série de reportagens Música Popular Brasileira em Curso, que será oriunda do curso livre de Música Popular Brasileira oferecido pelo Centro de Formação em Artes (CFA), da Fundação Cultural do Estado da Bahia (FUNCEB). A partir da próxima segunda-feira, 8 de janeiro de 2018, os leitores já vão poder acompanhar os conteúdos produzidos.
O Curso
O curso livre segue com inscrições abertas até o dia 8 de janeiro e será ministrado por Vítor Queiroz, historiador, mestre em História Social da Cultura pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e doutor em Antropologia (Unicamp). Na ocasião, Vítor pretende fazer um apanhado histórico da música feita no Brasil e levantar debates e implicações desse processo. O professor promete também fazer muita audição de músicas durante cada encontro. Ao todo, os cursistas vão participar de cinco aulas e o Desde vai cobrir todas elas, com exclusividade. A sequência das aulas (e da série de reportagens do blog) é a seguinte:
  • 8/1: Viva São João (o que é MPB, o surgimento da MPB, o baião e os gêneros sertanejos, Dorival Caymmi);
  • 9/1: Artigo nacional (samba e identidade nacional na Era Vargas, crime e malandragem);
  • 10/1: As canções que você fez pra mim (do samba-canção a Roberto Carlos, do brega ao pagode romântico);
  • 11/1: Você não gosta de mim, mas a sua filha gosta (da Tropicália ao surgimento do rock nacional);
  • 12/1: Eu me transformo em outras (o declínio das gravadoras, as cenas independentes, o axé e o funk).

Vítor Queiroz: historiador faz panorama da música brasileira em curso na FUNCEB. Foto: Grácia Queiroz

As aulas começam no dia 8 e vão até 12 de janeiro, sempre das 8h30 às 12h30. A atividade é aberta para qualquer pessoa, independentemente se tem relação com música ou não. Para se inscrever, os interessados devem comparecer ao CFA, que fica na Rua do Bispo, n.º 29, Pelourinho, Salvador-BA. A taxa de inscrição é de R$ 100 (cem reais). Para saber mais informações, ligue para (71) 3117-6367.
Então, está combinado: na próxima semana, começa uma nova aventura do conhecimento aqui no blog! Até lá!
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O primeiro de Ana

Ana Carolina na capa do seu primeiro CD. A foto é de Greg Vanderlans. Imagem: reprodução do site da artista

Por Raulino Júnior ||Desde Então: análise de produtos culturais de outrora|| 
Minha garganta estranha, quando não te vejo/Me vem um desejo doido de gritar/Minha garganta arranha a tinta e os azulejos/Do teu quarto, da cozinha, da sala de estar“. Em 1999, esses versos eram bastante populares no Brasil. A responsável por isso foi a cantora e compositora Ana Carolina. O primeiro CD dela, intitulado Ana Carolina (BMG), ecoou com o grito forte de Garganta, música de Totonho Villeroy,  faixa 6 da obra. A canção traz um eu lírico feminino “empoderado” e bastante coerente com os debates dos dias de hoje: “Sei que não sou santa, vezes vou na cara dura/Vezes ajo com candura, pra te conquistar/Mas não sou beata, me criei na rua/E não mudo minha postura só pra te agradar“.

O disco de estreia da mineira de trouxe também a metafórica Tô Saindo (Totonho Villeroy): “[…] Eu tô saindo, eu tô saindo deste buraco/Help! Eu preciso sambar […]“; e Alguém Me Disse (Evaldo Gouveia/Jair Amorim), uma dessas de dor de cotovelo, com melodia agradável, arranjo de bolero e letra interessante: “[…] Se vais beijar/Como eu bem sei/Fazer sonhar/Como eu sonhei/Mas sem ter nunca amor igual/Ao que eu te dei“. A faixa 3, Nada Pra Mim, tocou bastante no rádio. A letra de Jonh Ulhoa (da banda Pato Fu) ganhou força na interpretação de Ana Carolina, ficando ainda mais filosófica. Trancado, a primeira da série de canções da própria Ana que figura no CD, tem eu lírico masculino e mensagem introspectiva: “Eu tranco a porta para todos os gritos/E o silêncio também está lá fora/Agora, a porta está trancada“. Em Armazém (Ana Carolina), a cantora deixa evidente o seu lado de instrumentista. O pandeiro bem marcado ajuda a dar graça à letra simples e descomprometida.

A Canção Tocou Na Hora Errada (Ana Carolina) é a sétima faixa do CD. Tem ótima letra e melodia. É uma das melhores do álbum. Assim como Agora Ou Nunca (Arnaldo Antunes), O Melhor De Mim (Frejat/Paulinho Moska/Dulce Quental), O Avesso Dos Ponteiros (Ana Carolina) e Beatriz (Chico Buarque/Edu Lobo). Aqui, valem algumas ressalvas: Agora Ou Nunca é uma daquelas letras cheias de ludicidade e de espírito filosófico que saem da cabeça de Arnaldo Antunes: “Nunca se responde uma pergunta/Nunca é o Dia de São Nunca“; O Melhor De Mim é uma declaração de amor sem moderação. Beira o ultrarromantismo: “[…] Se amor tivesse um nome/Seria o seu […]“; O Avesso Dos Ponteiros tem poesia rica, que fala de transitoriedade do tempo: “A idade aponta na falha dos cabelos/Outro mês aponta na folha do calendário/As senhoras vão trocando o vestuário/As meninas viram a página do diário/O tempo faz tudo valer a pena/E nem o erro é desperdício/ Tudo cresce/ E o início/Deixa de ser início/E vai chegando ao meio/Aí começo a pensar que nada tem fim/Que nada tem fim“. A melodia é primorosa, com o som dos violinos contribuindo para que a canção fique ainda mais bonita; Beatriz dispensa comentários, não é? A interpretação de Ana é certeira e cheia de personalidade.

Além de regravar Chico (Beatriz) e Tom Jobim (Retrato Em Branco e Preto, parceria dele com Chico Buarque), Ana regravou Lulu Santos (Tudo Bem). Em todas, ela emprestou muito bem a sua identidade musical. Perder Tempo Com Você (Alvin L.) destoa do bom repertório do CD. Foi uma perda de tempo gravá-la. Tô Caindo Fora (Ana Carolina/Marilda Ladeira/Fernando Barreto) fecha com qualidade o primeiro trabalho da cantora. De fato, o disco é muito bom. Escute. A sua garganta não vai estranhar.

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Kleiton e Kledir de corpo e alma

Kleiton e Kledir. Foto: reprodução da página oficial da dupla no Facebook

Por Raulino Júnior  ||DESDEnhas: as resenhas do Desde||

“Deu pra ti/Baixo-astral/Vou pro show de Kleiton e Kledir/Tchau!”. Um fã dos irmãos Kleiton e Kledir bem que poderia alterar um pouco a letra da famosa canção Deu pra Ti (Kleiton Ramil/Kledir Ramil) e cantar dessa forma aí. Principalmente, após assistir ao show de ontem à noite, no Teatro Sesc Casa do Comércio, em Salvador. É que, durante a apresentação, a dupla de Pelotas fez o público rir o tempo todo com as histórias que contava, além de cantar músicas consagradas da carreira. Não houve mesmo espaço para o baixo-astral.

Com um repertório que evidenciava a trajetória musical deles, os irmãos fizeram um roteiro que agradou a plateia, formada, predominantemente, por pessoas mais maduras. Usando a boa estratégia de cantar as músicas mais conhecidas no primeiro momento do show, Kleiton e Kledir abriram a apresentação com Canção da Meia-Noite (Zé Flávio), da época em que integravam a banda Almôndegas, extinta em 1979. “A gente chegou relembrando a fase paleolítica de Kleiton e Kledir”, brincou Kledir Ramil, com seu peculiar bom humor. A propósito, essa foi a tônica do show, com Kleiton também arrancando boas gargalhadas do público em outras ocasiões.

Em seguida, cantaram Nem Pensar (Kleiton Ramil/Kledir Ramil) e Fonte da Saudade (Kledir Ramil), que contou com o coro dos espectadores. Quando entoaram Viva (Kledir Ramil), a plateia foi levada pela sonoridade da canção, que pareceu sair do repertório d’A Cor do Som e dos Novos Baianos, pelo suingue, letra e qualidade do arranjo.

Como é de praxe em show de duplas, em alguns momentos da apresentação cada um deles protagonizava a cena, ficando sozinho no palco. Foi assim que Kledir cantou aquela que, talvez, seja a música mais conhecida do repertório dos irmãos: Paixão (Kledir Ramil). O público, claro, vibrou e acompanhou cada verso com entusiasmo. Para aproveitar o clima junino, os cantores colocaram Noite de São João (Pery Souza/Kledir Ramil) no roteiro, fazendo a plateia interagir ainda mais com eles.

Do novo CD, intitulado Com Todas as Letras (Biscoito Fino, 2015), entraram a necessária Lado a Lado (Kleiton Ramil/Kledir Ramil/Alcy Cheuiche) e Pingos nos Is (Kleiton Ramil/Kledir Ramil/Martha Medeiros). Lado a Lado é baseada em um fato real e traz o depoimento de um pai (no caso, Alcy Cheuiche) a respeito do namoro da filha homossexual: “Se tu gostas dela, minha bela/O que é que eu posso dizer?/Me emociono ao ver vocês duas/O amor precisa acontecer”. Todas as canções do disco foram feitas em parceria com renomados escritores da literatura gaúcha. Entre os nomes, ainda estão Luis Fernando Verissimo e Claudia Tajes.

Na sua vez de ficar sozinho no palco, Kleiton homenageou Gilberto Gil com Eu Só Quero um Xodó (Dominguinhos/Anastácia), que o baiano gravou no disco Refestança, de 1978. Depois, protagonizou um dos momentos mais sublimes do show: cantou Corpo e Alma, versão de Kledir para Bridge Over Troubled Water, de Paul Simon. A música, que parece uma oração, reflete a nítida sintonia entre eles: “Sei que a vida vai aprontar/E o que vier, azar/A dois é fácil segurar/Se Deus deixar, viu, meu amigo/Vou sempre estar aqui/Junto a ti/Feito corpo e alma/Meu irmão, meu par”. De emocionar.

Nos momentos finais do espetáculo, o romantismo deu lugar à poesia social. Kleiton e Kledir, no intuito de contextualizar o show com ares soteropolitanos, cantaram Guri de Salvador (Kledir Ramil/Kleiton Ramil), que nasceu quando um menino de rua de Salvador reconheceu Kledir e pediu para ele fazer um reggae. Logo após, vieram Tô que Tô (Kleiton Ramil/Kledir Ramil), Vira Virou (Kleiton Ramil) e Deu pra Ti. No tradicional bis, foi a vez de Maria Fumaça (Kleiton Ramil/Kledir Ramil) entrar na trilha.

A apresentação de Kleiton e Kledir foi de surpreender. Os cantores, que também são excelentes instrumentistas, fizeram o concerto sem acompanhamento de banda. Usaram apenas a voz, o violão (Kledir e Kleiton) e o violino (Kleiton). Um show de música com letra e instrumental. Os artistas estavam completamente entregues, de corpo e alma. Superlativos!

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Cazuza: só as mães (e os fãs) são felizes

Foto: reprodução do site oficial de Cazuza

Por Raulino Júnior ||Desde Então: análise de produtos culturais de outrora||

Um livro emocionante, cheio de histórias curiosas e com uma narrativa que não deixa o leitor desgrudar das páginas. Assim é Cazuza: só as mẽs são felizes, biografia lançada em 1997, pela Editora Globo. A jornalista Regina Echeverria foi quem teve a missão de transpor para o papel as 20 horas de depoimento de Lucinha Araujo, mãe do cantor. O trabalho foi tão bem-sucedido que, em 2004, serviu de base para o filme Cazuza: o tempo não pára, de Sandra Werneck e Walter Carvalho.

O subtítulo da obra [só as mães são felizes] se refere a uma canção homônima composta por Frejat e Cazuza, lançada por este em 1985, no álbum que ficou conhecido como Exagerado, o primeiro após a saída do Barão Vermelho. No prefácio, Lucinha mostra que as mães não são tão felizes assim: “Lamento não ter tido a chance de conviver mais, muito mais, do que os poucos 32 anos de Cazuza. Sinto não ter tido mais tempo para aprender a compreendê-lo e fazer com que perdoasse os erros do passado: o excesso de zelo, a cegueira que me impedia ver o poeta que ele era, e aproveitar um pouco mais do artista inconformado em que se revelou. Queria que me perdoasse, por ter dado tanta importância a coisas tão pequenas, nas quais eu acreditava como verdade suprema. Que me perdoasse por tê-lo sonhado à minha imagem e semelhança e a forçar que ele pautasse sua vida, que apenas começava, em convenções inúteis“.

Quem lê o livro, conhece um pouco da intimidade da família Araujo, descobre que Cazuza sempre fora chamado pelo apelido, mesmo antes de nascer, e que o cantor só passou a gostar do seu nome de batismo (Agenor) após descobrir que Cartola também tinha sido batizado com tal antropônimo. Mas, na verdade, o nome de Cartola era Angenor. Será que Cazuza morreu sem saber disso?

Em 21 capítulos, Lucinha revela detalhes da convivência com o seu Agenor de Miranda Araujo Neto. A vontade do leitor é a de não chegar naquele fatídico 7 de julho de 1990, data da morte de Cazuza. Três meses depois, em 17 de outubro, Lucinha, com o auxílio de alguns amigos, fundou a Sociedade Viva Cazuza, que dá assistência a crianças e adolescentes carentes portadoras do vírus da Aids. Assim, muitas mães são felizes. Viva Lucinha!

Referência:

ARAUJO, Lucinha. Cazuza: só as mães são felizes. Lucinha Araujo em depoimento a Regina Echeverria. 2.ed. São Paulo: Globo, 2004.

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