Arquivo mensal: julho 2019
A esmola e a culpa
Por Raulino Júnior ||Desde Já: as crônicas do Desde||
Andar pelas ruas de alguns grandes centros urbanos do Brasil é se sentir culpado o tempo todo. Explico: cada vez que somos abordados por pessoas pedindo esmolas, o sentimento de culpa vem imediatamente. Porque não dá para pensar: “Eu não tenho nada a ver com isso”. Não dá. Às vezes, você não tem dinheiro mesmo para dar; às vezes, você tem e não quer dar, porque pensa no problema estrutural que o gesto pode perpetuar; e, às vezes, você ignora o pedido e se sente culpado por isso.
Ninguém é o salvador da pátria. Muitas vezes, tendemos a pensar que somos e queremos resolver tudo que está ao nosso alcance. É muito triste encontrar pedintes, diariamente, querendo uns míseros reais para matar as fomes (tenho certeza de que o leitor entendeu o porquê do uso do plural). É triste. Quando a gente lembra que o atual presidente da República afirmou que é “uma grande mentira” falar que se passa fome no Brasil, a revolta se alia à tristeza. É mais uma prova de que o chefe do Executivo nacional não tem nenhuma noção do país que preside. Não é preciso muito esforço nem muito estudo para saber que o problema da fome no Brasil é crônico. Voltemos à esmola.
O que vamos fazer com esse Brasil que faz do pedido de dinheiro uma profissão? Uma blogueira achou melhor debochar da cara de uma idosa e reagiu ao pedido perpetuando mais uma violência: “A senhora tem troco pra R$100?”. Pelo visto, não estamos fazendo e não vamos fazer nada. Estamos impotentes e já banalizamos a presença, nas esquinas, de quem tem o pedido de dinheiro como um ato de desespero ou de acomodação.
Os governantes não pensam em políticas públicas para tirar, de fato, os pedintes das ruas. A sociedade violenta física e simbolicamente. A gente caminha cheio de culpa. Só isso. Pensar em resolver o problema seria pedir demais?
Sigamos.
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