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Imersão Poética

Livro de estreia de Pedro Vale é repleto de poesias reflexivas. Imagem: captura de tela

Por Raulino Júnior ||DESDEnhas: as resenhas do Desde||
Na quarta-feira passada, 23 de julho, via Twitter, recebi o convite do escritor português Pedro Vale para resenhar o seu primeiro livro, intitulado Azul Instantâneo. Ele enviou o arquivo em PDF e, de imediato, embarquei na leitura. O livro, que reúne textos escritos entre março de 2016 e setembro de 2017, na página do Facebook de Pedro, é poético do início ao fim. E isso não é uma metáfora apenas, é fato. O leitor se depara, logo na segunda página da obra, com o verso “Ofereço”. Na sequência, vários poemas, predominantemente ligados à poesia concreta, desfilam nas mais de 60 páginas da antologia. Na última, o verso “lembro”. Então, o que se conclui é que Pedro oferece para o leitor as suas criações e faz questão de que ele lembre da leitura feita, de que perpetue e compartilhe aquilo que foi lido. Pedro quer ser lembrado.
Azul Instantâneo é repleto de poesias reflexivas, de tom filosófico. Na página 5 do livro, lê-se “Liberto a palavra e solto o pulso”. Na 34, “O rio não corre,/Só o pensamento”. Pedro fala de amizade, do fazer poético, de dificuldades da vida e toda a poética é costurada com muita introspecção. Em um dos poemas, o autor afirma:
“É preciso viver sem paixões.
Mergulhar  no absoluto anonimato,
Permanecer morto ou vivo até o fim.
[…]”
Será que é possível viver sem paixões? Fica a reflexão. Em alguns momentos, a própria poesia é o foco dos textos:
Porto
a poesia vai
pela rua,
esconde-se
nas manhãs mais
frias.
e é à noite que lhe foge
a voz.
lenta
e lenta,
lentamente,
até
desembainhar
na
f
 o
  z
A maioria dos textos não tem título e Pedro traz poemas escritos também em inglês. A instantaneidade da obra se dá, além dos temas abordados, pela leitura rápida. Lê-se de uma sentada só. Há um evidente talento do escritor, ele consegue cumprir o que se propõe a cumprir. Sem grandes pretensões, Azul Instantâneo quer capturar o leitor e consegue fazer isso. A leitura é envolvente. Principalmente, porque a vida está presente o tempo todo no livro, para o bem e para o mal:
Talvez um dia recordes
num qualquer espelho torto
quão simples fora a tua salva
e te lembres daquela vez
em que ceáramos apenas meia
laranja e nada de pão naquela casa cega
com o telhado a verter lágrimas
de fel.
Pedro tem 40 anos e nasceu em Guimarães, mas, há 17, está radicado na Ilha da Madeira. Além de escritor, é professor.
Referência:
VALE, Pedro. Azul Instantâneo. 1. ed. Portugal: edição do autor. 2018.

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#Desde8, Crônica, Cultura, Desde Já, Jornalismo Cultural

A esmola e a culpa

Imagem: reprodução do site Diário de Contagem.

Por Raulino Júnior ||Desde Já: as crônicas do Desde||

Andar pelas ruas de alguns grandes centros urbanos do Brasil é se sentir culpado o tempo todo. Explico: cada vez que somos abordados por pessoas pedindo esmolas, o sentimento de culpa vem imediatamente. Porque não dá para pensar: “Eu não tenho nada a ver com isso”. Não dá. Às vezes, você não tem dinheiro mesmo para dar; às vezes, você tem e não quer dar, porque pensa no problema estrutural que o gesto pode perpetuar; e, às vezes, você ignora o pedido e se sente culpado por isso.

Ninguém é o salvador da pátria. Muitas vezes, tendemos a pensar que somos e queremos resolver tudo que está ao nosso alcance. É muito triste encontrar pedintes, diariamente, querendo uns míseros reais para matar as fomes (tenho certeza de que o leitor entendeu o porquê do uso do plural). É triste. Quando a gente lembra que o atual presidente da República afirmou que é “uma grande mentira” falar que se passa fome no Brasil, a revolta se alia à tristeza. É mais uma prova de que o chefe do Executivo nacional não tem nenhuma noção do país que preside. Não é preciso muito esforço nem muito estudo para saber que o problema da fome no Brasil é crônico. Voltemos à esmola.

O que vamos fazer com esse Brasil que faz do pedido de dinheiro uma profissão? Uma blogueira achou melhor debochar da cara de uma idosa e reagiu ao pedido perpetuando mais uma violência: “A senhora tem troco pra R$100?”. Pelo visto, não estamos fazendo e não vamos fazer nada. Estamos impotentes e já banalizamos a presença, nas esquinas, de quem tem o pedido de dinheiro como um ato de desespero ou de acomodação.

Os governantes não pensam em políticas públicas para tirar, de fato, os pedintes das ruas. A sociedade violenta física e simbolicamente. A gente caminha cheio de culpa. Só isso. Pensar em resolver o problema seria pedir demais?

Sigamos.

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#Desde8, Cultura, Jornalismo Cultural, RauLendo: leituras em pauta

Hebe Camargo: vida, obra e outras gracinhas

Hebe Camargo: na capa da biografia, a foto de Petronio Cinque faz a gargalhada de Hebe ecoar. Imagem: site do Grupo Editorial Record.

Por Raulino Júnior||RauLendo: leituras em pauta||

Se estivesse viva, a apresentadora Hebe Camargo estaria com exatos 90 anos e quatro meses de idade. Certamente, cheia de vida, como era comum vê-la sempre que entrava no ar na TV ou nas inúmeras entrevistas que concedeu em mais de 60 anos de carreira. A paulista de Taubaté estreou na vida em 8 de março de 1929 e viu a cortina se fechar em 29 de setembro de 2012, vítima de uma parada cardíaca. Apesar de ter nascido na cidade que virou sinônimo de “mentira”, devido a um caso de falsa gravidez de uma mulher, que ganhou repercussão na mídia, em 2012, Hebe Camargo carregou uma verdade durante toda a sua vida: era a melhor apresentadora da televisão brasileira. E era mesmo! É oportuno até fazer uma brincadeira com o nome dela, para ratificar essa qualidade: HEBEst! Quem assistia aos programas de Hebe, podia constatar isso. Segura, carismática, inteligente e a que melhor sabia usar as deixas para introduzir um merchan.
Em 2017, a editora BestSeller colocou no mercado o livro Hebe: a biografia, de autoria de Artur Xexéo. A obra segue o feijão com arroz de publicações dessa natureza, cheia de linearidade e sem nenhum esforço criativo por parte do autor. O fato de Hebe ser a personagem do livro é o que faz a biografia ser interessante. Hebe era gigante e, dificilmente, um produto em homenagem a ela ficará ruim. Por sinal, em 26 de setembro, estreia o filme Hebe – A Estrela do Brasil (direção de Maurício Farias e roteiro de Carolina Kotscho), com Andréa Beltrão no papel da artista.
Em mais de 200 páginas, Xexéo conta como Hebe começou a carreira, a fase de cantora, atriz e a consagração como apresentadora. As curiosidades da vida da Rainha da TV, os amores, as decepções, as brigas, os embates com políticos e os desafios estão presentes no documento. Nele, o leitor fica sabendo que Hebe quase seria “Beatriz”. Contudo, uma tia fez o pai mudar de ideia. Com tanta vivacidade, a dama da TV brasileira não poderia ter outro nome mesmo. Na mitologia grega, “Hebe” é a deusa da juventude. Para quem gosta de cultura nacional e televisão, vale muito a pena conhecer um pouco mais da vida dessa artista cheia de “gracinha”.
Referência:
XEXÉO, Artur. Hebe: a biografia. 7ª ed. Rio de Janeiro: BestSeller, 2018.
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