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Um filme que toca

#VOCÊ VIU? O objetivo da seção “Você viu?” é analisar produtos que já fizeram parte (e ainda fazem, né?) do movimentado mercado cultural do Brasil; sem discriminações. Fique à vontade!

Crédito: Divulgação

O filme Uma onda no ar (Brasil, 2002), dirigido por Helvécio Ratton, poderia muito bem figurar na lista dos indicados ao Oscar. A produção, estrelada por Alexandre Moreno, apresenta um argumento muito convincente e mostra como o cinema nacional pode produzir algo de qualidade sem precisar cair na coisa rasteira de usar o sexo para atrair espectadores.

A obra cinematográfica conta a história de Jorge, um suburbano que ver seu sonho de ser “artista” virar realidade a partir da criação de uma rádio comunitária na favela onde mora. Mas, por causa da burocracia e de uma boa dose de preconceito, a Rádio Favela, criada pelo protagonista e alguns amigos, é impedida de continuar no ar. No entanto, depois de sua prisão e de muitas situações incompreensíveis, a comunidade da qual Jorge é oriundo se organiza para fazer a rádio voltar a funcionar. O filme é entrecortado por muitas críticas implícitas acerca do racismo e da pobreza. Ou seja, mostra como alguns aspectos sociais podem se sobrepor ao talento e dessa forma impossibilitar que ele se manifeste. A rádio tinha como objetivo educar a comunidade carente.

O curioso é a brincadeira, não sei se proposital, que o nome da rádio faz com um gênero que fez muito sucesso no Brasil: a rádionovela. É como se o diretor quisesse mostrar que a posição dos opressores do filme não passava de um teatro. A lei não é a mesma para todos. O tom incisivo usado para impedir a Rádio Favela de funcionar era carregado de implicações discriminatórias.

Enfim, o filme toca nos nossos sentimentos e nos faz refletir sobre temáticas que passam despercebidas. Quantos Jorges estão por aí sendo desrespeitados e tendo os seus talentos tolhidos? Inúmeros! É importante não deixar que a frequência das discussões seja como a frequência de uma rádio: passageira! Espero que todo mundo se toque!

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Cultura, Jornalismo Cultural, Música, MPB, Poesia, Resenha, Você Viu?

Blogue DESDE QUE EU ME ENTENDO POR GENTE lança seção “Você viu?” analisando DVD de Arnaldo Antunes

#VOCÊ VIU?

O objetivo da seção “Você viu?” é analisar produtos que já fizeram parte (e ainda fazem, né?) do movimentado mercado cultural do Brasil; sem discriminações, mas com alguns preconceitos. Afinal, somos preconceituosos por natureza. Fique à vontade!

ARNALDO ANTUNES REÚNE EM DVD TODO O SEU LEGADO

O DVD Arnaldo Antunes Ao Vivo no Estúdio (Brasil, 2007, gravadora Biscoito Fino) mostra toda a versatilidade de Arnaldo Antunes, um artista modernista por natureza e muito preocupado com a qualidade de seus trabalhos. O registro foi produzido pelo próprio Arnaldo, em parceria com Betão AguiarChico Salem e Marcelo Jeneci. Quem assinou a direção de vídeo foi Tadeu Jungle e a gravação foi realizada no tradicional Estúdio Mosh, em São Paulo. Arnaldo estava, portanto, cercado por um elenco que, assim como ele, tem uma vasta experiência no cenário musical do Brasil. Isso, certamente, foi um dos motivos para que a obra saísse tão bem acabada.

Arnaldo Antunes Ao Vivo no Estúdio é o primeiro DVD oficial da carreira de Arnaldo (antes, o cantor lançou o do “projeto” Tribalistas (2002) e teve o VHS de seu primeiro trabalho solo (Nome, de 1993) transformado em DVD pela Sony/BMG (2006)). As músicas apresentadas no audiovisual foram, predominantemente, compostas por Arnaldo Antunes com alguns parceiros e dão a dimensão de toda a sua subjetividade. O DVD tem 24 faixas e conta com participações especiais de Nando ReisEdgard ScandurraBranco Mello e Tribalistas (leia-se Carlinhos Brown e Marisa Monte que, com Arnaldo, formaram o trio em 2002). Nos extras, três faixas bônus, galeria de fotos e um clipe multitake da música Hotel Fraternité.

Arnaldo trouxe um clima de sarau para a gravação do DVD. As intervenções poéticas realizadas durante o espetáculo comprovam isso. O modo peculiar de cantar, meio que falando, contribui para que o poeta e o cantor se confundam no palco. Uma das maiores evidências disso se dá na interpretação de O Silêncio, em que Arnaldo dá uma longa pausa no meio da música (de propósito) e quebra o silêncio com a declamação de Desafinado, de Tom Jobim; logo após, retoma a canção original. Para corresponder ao viés modernista de Arnaldo, pode-se afirmar, usando um neologismo, que ele “declanta” (declama e canta) suas músicas e essas “declantações” fazem parte da identidade do artista Arnaldo Antunes e o torna singular entre os intérpretes brasileiros.

O DVD traz canções emblemáticas da carreira do ex-Titãs, como a melancólica Socorro e Saiba, que foi gravada por Adriana Calcanhoto no CD Adriana Partimpim, lançado em 2004 e voltado para o universo infantil. Falando em criança, Arnaldo faz uma releitura interessante de Acabou Chorare, sucesso dos Novos Baianos. A regravação de Qualquer Coisa, de Caetano Veloso, foi uma boa sacada e transborda de lirismo. Num determinado momento da música, Arnaldo insiste em repetir o verso “Sem essa aranha”. Por quê? Vai saber! Coisas do Arnaldo.

O show do DVD é apresentado de forma bem intimista. Tanto é que os convidados saem de uma diminuta plateia, o que reforça ainda mais essa atmosfera de proximidade desejada pelo artista. Dentre as participações especiais, a de Nando Reis é a mais primorosa. A música Não vou me adaptar relembra os bons tempos dos Titãs e mostra a felicidade dos dois amigos em dividirem os vocais. Por outro lado, o dueto de Arnaldo e Edgard Scandurra em Judiaria parece o primeiro ensaio de adolescentes numa banda de garagem e lembra muito as caras e bocas de Júnior Lima e seus companheiros da fracassada Nove Mil Anjos, para quem fazer rock’n’roll é demonstrar cara de mau. A presença de Branco Mello é insossa, embora a canção Eu não sou da sua rua, composta por ele e por Arnaldo, tenha uma boa mensagem. Já os Tribalistas só pecam por não mostrar nenhuma novidade nas músicas apresentadas. Os arranjos de Um a um e Velha Infância são os mesmos do CD lançado em 2002. A impressão que dá é a de que Arnaldo os convidou apenas para constar. Mas, como a intenção do artista era fazer uma síntese de sua trajetória musical, é compreensível o convite aos seus colegas de tribo.

O DVD Arnaldo Antunes Ao Vivo no Estúdio apresenta um inventivo Arnaldo Antunes, sempre disposto a se reinventar. A começar pelo próprio nome da obra, que parece guardar uma contradição: é “ao vivo” e “no estúdio”. Até as esquisitices do artista, que volta e meia pula no palco como se estivesse brincando amarelinha, são válidas porque servem para quebrar o ar sisudo de Antunes e emprestam humor às canções. Não dá para negar que Arnaldo fez uma boa autossíntese no registro audiovisual.


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